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Agenda de Trump significa menos liquidez e mais pressão sobre juros de mercados emergentes
21 de janeiro de 2025
Por Eduardo Laguna
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, deu início a um governo que coloca o Brasil diante de desafios de dimensões, tanto política quanto econômica, maiores do que os do primeiro mandato do republicano. Se oito anos atrás Trump tinha como interlocutor no Brasil o então presidente Michel Temer, e depois Jair Bolsonaro, desta vez a interação vai se dar com um governo de esquerda, que apoiou abertamente a campanha democrata na eleição vencida pelo presidente que tomou posse nesta segunda-feira em Washington.
Nos últimos anos, o Brasil também aprofundou a sua parceria bilateral com a China, passando a ter uma maior parcela das exportações destinadas ao gigante asiático, com quem os EUA travam uma disputa por hegemonia global.
Mas as diferenças entre os países e os obstáculos não são de natureza apenas política. Trump volta ao poder com agendas fiscal, imigratória e comercial vistas como inflacionárias, o que, em termos práticos, significa menos liquidez e maior pressão sobre os juros de mercados emergentes num momento em que a Selic sobe, pelas previsões de mercado, em direção aos 15% e o IPCA vai se descolando da meta perseguida pelo Banco Central (BC).
Um estudo internacional feito pelo departamento de análises do Citi aponta o Brasil como a segunda economia da América Latina mais vulnerável às políticas aguardadas no governo Trump. Mais vulnerável do que o Brasil, aparece apenas o México num índice calculado pelo Citi que leva em conta, entre outras dimensões, a orientação ideológica do governo de cada país e as relações comerciais com a China.
O relatório observa que o novo secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, tem sido crítico aos governos de esquerda na América Latina, o que pode indicar um ambiente político desafiador para o Brasil sob a administração Trump. Países com governos de esquerda e com baixa popularidade são considerados mais vulneráveis se Trump empreender uma gestão mais ativa e ideológica.
Além disso, as economias com maior presença da China, seja via comércio ou investimento, podem ser vistas como mais alinhadas aos interesses econômicos de Pequim, e menos com os de Washington. Assim, no índice de exposição a Trump criado pelo Citi, o Brasil supera países como Argentina – governada por Javier Milei, um aliado do novo presidente -, Colômbia e Chile.
Mais a perder
Especialistas em relações internacionais ouvidos pelo Broadcast ponderam que é possível enxergar oportunidades a produtos brasileiros se o Brasil conseguir passar ileso pelo bangue-bangue na arena comercial entre Estados Unidos e seus parceiros. Ou seja, ocupar espaços deixados por produtos que terão barreiras para entrar nos EUA, assim como aproveitar as prováveis retaliações. Foi o que aconteceu no primeiro mandato de Trump, quando a China substituiu soja e proteínas que comprava de fornecedores americanos.
Nessa perspectiva positiva, jogam a favor do Brasil na competição internacional as vantagens logísticas, longe dos entraves de rotas afetadas por conflitos no Oriente Médio e na Ucrânia, e a disponibilidade de recursos naturais quando o mundo faz a transição energética. Há também, entre economistas e especialistas em relações internacionais, um entendimento de que o Brasil não deve ser foco das tarifas de Trump, uma vez que o País rende aos EUA o sétimo maior superávit comercial. Ou seja, os EUA exportam mais do que importam produtos brasileiros, de modo que, em tese, seria de interesse dos americanos manter um fluxo comercial aberto com o Brasil.
O problema é que Trump já deu sinais de que sua artilharia não vai se voltar apenas à China. A agenda de proteção comercial também ameaça com barreiras os vizinhos México e Canadá, assim como a Europa. Trump também já ameaçou aplicar tarifas de 100% contra o Brics, caso o bloco de economias emergentes do qual o Brasil faz parte insista na criação de uma nova moeda para substituir o dólar.
Um receio é de que, diferente do primeiro mandato, Trump não tenha agora uma equipe no Departamento de Comércio capaz de conter suas ações mais agressivas. Isso pode acontecer num contexto em que a China lida com um excesso de capacidade em sua indústria, na esteira da crise imobiliária no gigante asiático.
Um acirramento na guerra comercial pode, então, impactar o Brasil em duas frentes. De um lado, especialistas apontam a um cenário de “perde-perde”, onde o aumento das tarifas e a retaliação entre países levam a uma queda no comércio internacional, aumento da inflação e redução do crescimento global. De outro, a China desova ainda mais seus produtos em mercados onde encontra um consumo em expansão ou com menos barreiras.
A história mostra que as consequências não foram boas quando os EUA levantaram barreiras comerciais para todos os lados. Na década de 1930, o aumento significativo de tarifas com a lei tarifária Smoot-Hawley Tariff Act tinha como objetivo proteger os produtores americanos da concorrência estrangeira. Sua consequência, no entanto, foi um acentuado declínio do comércio internacional, contribuindo para agravar a crise econômica global, na esteira da Grande Depressão.
Ainda que a China seja o maior destino das exportações brasileiras, é com os EUA que o Brasil tem uma pauta comercial mais diversificada e de maior densidade tecnológica. Além de petróleo, o Brasil vende para o país aeronaves, motores, produtos siderúrgicos, aparelhos de telecomunicação, medicamentos e equipamentos médicos. O número de empresas brasileiras que exportam aos EUA é mais de três vezes maior do que o de fornecedores que vendem, em sua maioria commodities, para a China.
Se Trump subir tarifas contra produtos brasileiros, ou se aberturas preferenciais forem motivo de negociações no novo governo, o desvio do comércio a outros mercados será mais desafiador em um mundo com mais barreiras comerciais.
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