7 de novembro de 2025
Por Paula Bulka Durães, do Viva
São Paulo, 07/11/2025 – Quanto dos tributos retorna à sociedade em forma de políticas públicas? Mais do que isso: quanto dos impostos é aplicado a políticas públicas para pessoas idosas? Com a elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e do Plano Plurianual (PPA), que definirão o orçamento municipal para os próximos quatro anos, aliada a uma reforma tributária que começa a tramitar em 2026 e deve mudar a estrutura de arrecadação de impostos no País, essas respostas podem começar a ser delineadas.
Com mais recursos à disposição de pequenos e médios municípios após a implementação da reforma tributária, a cobrança por serviços públicos tende a aumentar. Isso, porém, nem sempre beneficia a população acima de 60 anos, observa o pesquisador da Fundação Getulio Vargas Instituto Brasileiro de Economia (FGV IBRE) e pós-doutor em Economia pelas universidades de Harvard e Técnica de Lisboa, Flavio Ataliba.
“As necessidades de um município brasileiro variam muito. Há cidades com a maior parte da população jovem, o que requer mais políticas de educação básica, por exemplo. Enquanto locais com mais pessoas idosas vão estar mais preocupadas com demandas como saúde e outras que tangem o envelhecer”, explica.
Segundo o economista, os impostos retornam para a sociedade quando atendem aos anseios dos moradores, mas isso depende de uma administração eficiente e da cobrança popular.
É importante que exista muita transparência de onde o tributo será destinado. E esse é um princípio que está na Constituição e todos os municípios devem atender, mas isso não necessariamente ocorre na prática.”
Para o presidente do Conselho Municipal de Direitos da Pessoa Idosa de São Paulo, Nadir Francisco do Amaral, principal entidade que propõe projetos e ações para os mais velhos na metrópole, a falta de transparência orçamentária prejudica a execução dessas políticas. “O orçamento previsto para 2026 na cidade é de R$ 137 bilhões e quase R$ 570 bilhões ao final de quatro anos. Mas o quanto desses valores é reservado para a população idosa? Isso não está claro”, questiona.
Ele relata que o Conselho, apesar de possuir caráter deliberativo, não foi convidado a participar das discussões orçamentárias das pastas que mais impactam a população idosa, como a Secretaria da Saúde.
“Representamos 2,3 milhões de pessoas idosas e participamos deliberadamente das políticas públicas da cidade. Está na lei que nós devemos participar dessas reuniões, e mesmo assim não fomos convocados”, diz.
Aliás, São Paulo ocupa a segunda posição no ranking do Retornômetro. O índice da capital chega a 640,4, valor considerado bom, mas não excelente.
O Retornômetro – ferramenta desenvolvida pela consultoria especializada em dados, Assertif – tenta medir esse retorno por meio de um índice que varia de 0 a 1.000. A plataforma avalia a eficiência da gestão pública ao prestar contas e implementar ações que beneficiem a população.
Até o momento, o indicador analisou 396 municípios, pouco mais de 60% das cidades brasileiras com mais de 50 mil habitantes. Os dados são extraídos dos portais da transparência, normalizados e atualizados continuamente.
Segundo o mestre em Economia Aplicada pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e doutorando na Universidade de São Paulo (USP), Fernando Vieira, responsável pela metodologia estatística da ferramenta, a ausência de mais de um quarto dos municípios se deve à falta de transparência.
“Essas cidades não tinham dados e informações dispostas de forma clara para a população, algo que esperamos ser solucionado com a reforma tributária, que obrigará os municípios a se adequarem tecnologicamente para prestar contas do valor dos impostos que chegarão no destino do recolhimento, não mais na origem.”
O melhor desempenho paulistano aparece no eixo Viver, que mede a qualidade de vida e alcançou 836 pontos. O pior resultado está no eixo Prosperar, dedicado ao desenvolvimento econômico, com 339 pontos.
Secretaria especializada: o caso de Caraguatatuba
Uma solução apresentada pelo conselheiro, para a prestação de contas de políticas públicas que atendem às pessoas idosas seria a metrópole estudar a criação de uma Secretaria da Longevidade, a exemplo de municípios paulistas como Mogi das Cruzes e Caraguatatuba.
Inaugurada em 2011, a Secretaria dos Direitos da Pessoa com Deficiência e do Idoso (Sepedi) da cidade litorânea foi resultado de articulação política e facilitou a inserção da pasta no diálogo com outras secretarias que recebem orçamento expressivo e também atendem a população idosa, como explica a secretária Ivy Monteiro Malerba.
“É um trabalho de articulação constante aqui em Caraguatatuba, porque são todas as secretarias trabalhando juntas para alcançar ações de longevidade, ainda mais se tratando de um município do litoral norte, que atrai um grande contingente de aposentados.”
A secretária revela que em doze anos, o município saltou de 11 mil pessoas idosas para 20 mil em 2022, de acordo com o censo demográfico do IBGE.
“Passamos alguns anos estagnados, por razões políticas e de administração pública, mas hoje comemoramos a conquista do município de captar mais doações para o Fundo da Pessoa Idosa do que para o Fundo da Criança e do Adolescente”, afirma. Segundo ela, o fundo auxilia a dar uma sobrevida ao orçamento próprio, previsto para 2026 de R$ 22 milhões.
Para a secretária, a criação de uma pasta não é solução certeira para maior transparência orçamentária, mas pode ser um instrumento valioso. “A verba para o idoso pode estar fragmentada em outras secretarias e ainda assim ser um bom investimento, mas acredito que a secretaria traga um direcionamento especializado, que cutuque e coordene as outras pastas, porque elas não têm só a população idosa para atender, e isso exige um conhecimento mais especializado.”
O pesquisador da FGV Ibre Flavio Ataliba reforça que, antes de um orçamento expressivo e transparente, a população está mesmo preocupada com a execução dessas políticas públicas.
Não é necessário unificar em uma pasta ou coordenadoria o orçamento reservado para projetos que atendam a população idosa, mas é importante, porque gera transparência e planejamento. Porém, é ainda mais relevante você ter uma política pública bem desenhada e colocada em prática”, avalia.
O impacto da reforma tributária O presidente da Associação Paulista de Municípios e vice-presidente da Confederação Nacional dos Municípios, Fred Guidoni, afirma que o que desvia os esforços dos municípios paulistas de executar políticas públicas para pessoas idosas é, em grande parte, a dívida pública, resultado de desequilíbrio na redistribuição de verbas.
“A impressão geral que a população tem é que os serviços são ruins, de qualidade insuficiente e isso se explica muito pelo déficit.”
O pacto federativo firmado na Constituição brasileira fez a distribuição tributária do que compete à União, aos Estados e aos municípios, como ele explica. “O problema é que de lá para cá, o que é destinado para as cidades é pouco frente a todas as responsabilidades que elas assumiram. Mas isso não se resolve sobretaxando ainda mais a população e sim redistribuindo o que já existe, o que em partes é solucionado pela reforma tributária.”
Guidoni, que foi prefeito de Campos de Jordão, defende que, para além da reforma, seja pensada uma reestruturação sistemática dos impostos, como aumentar o porcentual do que retorna às cidades via Fundo de Participação dos Municípios (FPM), hoje limitado a 25,5% do arrecadado nacionalmente com o Imposto de Renda (IR).
Contato: paula.bulka@viva.com.br
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