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Especial/COP30: as surpresas do governo boas e ruins e onde buscar verba para o TFFF

7 de novembro de 2025

Por Paula Ferreira, Luciana Dyniewicz, do Estadão, e Mateus Maia, da Broadcast, enviados especiais

O Brasil chega nesta sexta-feira, 7, ao encerramento da Cúpula de Líderes, com notícias boas e outras nem tanto.

Após grande expectativa em relação ao tamanho de apoio que o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) receberia, o Brasil comemora a marca de cerca de US$ 5,5 bilhões prometidos em investimentos (US$ 1 bilhão do próprio governo Lula). A iniciativa, que prevê criar um fundo para remunerar por hectares de floresta preservados, é a principal aposta do Brasil na Cúpula do Clima da ONU (COP-30), que sucede as reuniões entre os chefes de Estado.

No governo, o montante levantado foi visto como “vitória”, uma vez que a proposta é considerada inovadora, o que dificultaria atrair investimentos (surpreendeu, por exemplo, o montante significativo previsto pela Noruega).

A análise é de que o aporte é suficiente para fazer o mecanismo funcionar. Além de alçar o Brasil e outros países florestais, como a Indonésia, a uma posição de liderança. Na área ambiental do governo, os aportes foram recebidos com comemoração.

Apesar disso, os números ainda estão distantes da meta de US$ 25 bilhões em investimentos soberanos para que o fundo atinja seu potencial máximo (US$ 125 bilhões) e ainda há condicionantes para os aportes de cada país. Os noruegueses, por exemplo, só investirão o prometido em 10 anos se houver ao menos outros US$ 10 bilhões soberanos no fundo e sua cota não for maior que 20%.

No caso da França, o compromisso feito durante o almoço de trabalho sobre o TFFF, com os chefes de Estado e seus representantes, foi de que os valores serão pagos até 2030.

Também houve espaço para “decepção” entre os integrantes do governo brasileiro. Nos bastidores, a ausência do Reino Unido na lista de investidores desagradou o Brasil.

Fontes ouvidas pelo Estadão comentam que ficou “chato” para os britânicos não aportarem recursos, sobretudo após a visita do príncipe William ao Brasil. Além disso, o país fazia parte do comitê que desenvolve o projeto, que conta com outros países, como França, Alemanha, Noruega e Emirados Árabes.

Apesar disso, há expectativa de que o Reino Unido e o Canadá possam anunciar aportes até março. Isso porque, até lá, esses países devem negociar seus orçamentos anuais. Também há a possibilidade de, nos próximos meses, a China sinalizar um investimento.

No início da tarde de quinta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) conduziu um almoço com chefes de Estado para “passar o chapéu” para o TFFF. O encontro teve piadas e cobranças.

Após ouvir as doações de Indonésia e da Noruega, o petista encarnou um leiloeiro e perguntou “quem dá mais” em aportes no TFFF. Quando Portugal anunciou 1 milhão de euros no fundo, o presidente respondeu com bom humor: “de grão em grão, a galinha enche o papo”.

Ao final, Lula cobrou os países ricos para que invistam recursos. Segundo ele, chegou a hora de essas nações pagarem a conta. Mais cedo, no discurso de abertura, Lula já havia cobrado aumento do financiamento climático para chegar a R$ 1,3 trilhão.

Historicamente, Lula tem cobrado mais dinheiro dos países ricos para a adaptação climática das nações vulneráveis, tema que tem travado as negociações nas últimas COPs.

Agora, a bola está no campo da Alemanha. Após uma fala da representante alemã no almoço, sinalizando que durante encontro entre Lula e o premiê alemão, Friedrich Merz, viria um anúncio, a equipe brasileira passou a contar com o montante para engordar ainda mais a conta do fundo.

Condicionantes

Entre representantes da sociedade civil, a leitura é de que o valor anunciado foi superior ao esperado, sobretudo porque os países investidores vivem momentos políticos conturbados e investimentos em projetos climáticos podem não render votos internamente.

A França, por exemplo, teve cinco primeiros-ministros em apenas dois anos. Ainda assim, sinalizou que deverá entrar com um aporte de 500 milhões de euro.

O aporte de US$ 3 bilhões anunciado pela Noruega também surpreendeu, dado seu volume significativo. “A impressão é de que o anúncio, no começo da semana, de que o Reino Unido não participaria do fundo acabou estimulando os outros”, diz o diretor executivo do WWF-Brasil, Mauricio Voivodic.

O aporte do país nórdico, porém, tem condicionantes. O recurso só se concretizará se o TFFF levantar US$ 10 bilhões de outros investidores até o fim de 2026. O país também estabeleceu que o capital que colocará não pode ultrapassar 20% do total arrecadado. Por último, demandou que o modelo de financiamento do fundo seja “sustentável” e que o nível de risco, “aceitável”.

Diretor de política pública, florestas e mudanças climáticas do Wildlife Conservation Society (WCS), Carlos Rittl afirma que o fato de o aporte norueguês não poder ultrapassar 20% do total é condizente com as leis do país.

Rittl participou da criação técnica do TFFF, da qual também colaborou a Noruega. Ele explica que o governo norueguês tem um limite legal para fazer esse tipo de investimento. Para o especialista, dado o ritmo dos anúncios do primeiro dia, é esperado que novos países façam parte do TFFF até o início de 2026.

Na visão do líder para o setor financeiro do Climate Finance Hub, Alexandre Kotchergenko Batista, as condições são esperadas depois do que aconteceu com o Fundo Amazônia, mecanismo de captação de doações para ações de combate ao desmatamento da Amazônia Legal. Criado em 2008, o fundo teve por anos a Noruega sendo o único doador relevante.

“A Noruega está dizendo que apoia o TFFF, mas que o mundo não deve contar apenas com ela pra fazer tudo sozinha de novo. É um modo de forçar outros países a se movimentarem”, diz Batista. Ele acrescenta que a demanda de que o fundo seja “sustentável” faz parte das melhores práticas de gestão.

Nos bastidores, o governo minimizou os prazos longos dados pelos países para fazer aportes. O Executivo acredita que não seria possível alavancar os recursos doados de uma vez. Por isso, considera interessante haver um fluxo anual de dinheiro para lastrear os papéis a serem vendidos e, assim, alcançar o total de US$ 125 bilhões almejados, ao final.

Estrutura problemática

Apesar das sinalizações positivas sobre o TFFF, o Brasil não começou a Cúpula dos Líderes com o pé direito. Durante a manhã, obras inacabadas, banheiros sem água e falhas na conexão de internet apareciam entre as reclamações dos que estava no Parque da Cidade (local onde a COP acontece). Com exceção das obras, os outros problemas foram sendo resolvido ao longo do dia.

Secretário da COP-30, Valter Correia disse que as obras ainda em andamento na Zona Azul da COP-30, já usada pela cúpula de líderes, “não são estruturais” e que os ajustes eram “previstos”.

Segundo ele, faltam apenas detalhes, como pinturas. Ele disse que elas devem terminar ao longo do fim de semana – a cúpula climática começa oficialmente na segunda-feira, 10.

Na chamada Zona Azul, onde ocorrerão as negociações, também se destacaram os preços altos de bebidas e comidas. Os preços variam de R$ 20 por um brigadeiro, ou R$ 25 por uma água, a R$ 40 pela fatia de bolo de cenoura. Uma refeição custa R$ 80. Os preços elevados, no entanto, são comuns em todas as COPs.

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