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Belagrícola: consultoria vê reorganização fora da Justiça e cita impacto no mercado do PR

21 de outubro de 2025

Por Gabriel Azevedo

São Paulo, 20/10/2025 – A consultoria Pine Agronegócios avalia que a Belagrícola deve buscar reorganização extrajudicial com apoio financeiro e venda de ativos nos próximos 3 a 12 meses, cenário que permitiria manter as operações e evitar recuperação judicial. A análise, assinada pelo CEO Alê Delara, examina os efeitos da tutela cautelar de 60 dias obtida pela distribuidora de insumos na Justiça de Londrina (PR) sobre o mercado de grãos e traça paralelos com casos anteriores do setor, especialmente a AgroGalaxy.

“A leitura mais provável, no horizonte de 3 a 12 meses, é que a Belagrícola busque reorganização extrajudicial, com apoio financeiro parcial e venda de ativos”, afirma o relatório. “Esse cenário permitiria a manutenção da operação, ainda que de forma mais conservadora, e evitaria o impacto sistêmico que uma recuperação judicial formal teria sobre toda a cadeia”, acrescenta o documento. A probabilidade de recuperação judicial plena não é descartada pela Pine, mas depende da evolução das negociações com investidores e credores nos próximos dois meses.

O relatório compara o caso da Belagrícola ao da AgroGalaxy, que entrou em recuperação judicial em setembro de 2024 com dívidas superiores a R$ 4,6 bilhões e obteve homologação em 2025 após oito meses de negociação. “A reestruturação incluiu fechamento de lojas, venda de unidades e priorização de fornecedores estratégicos”, registra a análise. “Uma reorganização drástica, mas que evitou o colapso total”, pondera a consultoria. Além da AgroGalaxy, o relatório cita a Fiagril, que em 2016 reduziu sua atuação e vendeu ativos após crise de liquidez, e a Renuka, do setor sucroalcooleiro, que passou por recuperação judicial longa e terminou com venda parcial de usinas.

A Pine atribui a situação da Belagrícola ao “esgotamento do ciclo de crédito fácil que marcou o agronegócio entre 2020 e 2022”. “Durante o auge das cotações internacionais, empresas do setor ampliaram suas carteiras de barter (troca de insumos por grãos) e aumentaram prazos de pagamento”, explica o relatório. “Com a queda dos preços da soja e do milho, a elevação dos juros e margens menores nas lavouras, muitos produtores deixaram de honrar compromissos”, acrescenta. Segundo a consultoria, essas dívidas, concentradas em distribuidoras de insumos, tornaram-se um passivo crescente. “Empresas de revenda, que operam no ‘meio da cadeia’, comprando a prazo da indústria e recebendo pós-safra dos produtores, foram as mais atingidas”, diz o documento.

A consultoria avalia que a suspensão de pagamentos e fixações provoca instabilidade comercial em toda a região de atuação da Belagrícola, que tem mais de 50 filiais e cerca de 60 unidades de recebimento. “Produtores que haviam fixado preços de soja e milho com a empresa estão, na prática, sem referência de liquidação, e precisarão buscar alternativas de proteção de preço”, afirma o relatório. Como a Belagrícola é uma das principais originadoras de grãos do Paraná, seu recuo temporário reduz a concorrência imediata nas praças locais, pressionando o basis, diferença entre o preço local e o internacional, e afetando fretes, segundo a Pine.

Nos municípios em que a empresa domina a originação, como Londrina, Cambé, Maringá, Castro e Ponta Grossa, cooperativas e tradings concorrentes tendem a ocupar o espaço, oferecendo pagamentos à vista ou prazos menores. “Esse movimento pode aliviar parte do impacto, mas a recomposição de liquidez será lenta”, pondera o documento.

Do ponto de vista de fornecedores de insumos e credores, a suspensão acende alerta sobre o risco sistêmico no canal de distribuição agrícola. “Grandes indústrias (de fertilizantes, sementes e defensivos) podem adotar postura mais conservadora, encurtando prazos e exigindo garantias maiores”, afirma a análise. “Bancos e fundos de crédito agrícola também devem revisar limites e reprecificar riscos no segmento”, acrescenta a Pine.

Se o cenário evoluir para recuperação judicial, os contratos de barter e CPRs poderão ser reclassificados e submetidos à novação, revisão judicial dos prazos. “Isso significa que o produtor credor poderá enfrentar atrasos ou renegociações compulsórias”, registra o relatório. “Situação idêntica à vivida por clientes da AgroGalaxy no ano passado”, compara a consultoria.

A Pine avalia que o caso simboliza o fim do ciclo de expansão desordenada do crédito rural via revendas. “De forma ampla, o caso simboliza o fim do ciclo de expansão desordenada do crédito rural via revendas”, afirma o relatório. “A partir de 2026, veremos distribuidoras operando com modelos mais prudentes, com exigência de garantias, menor alavancagem e foco em produtores com histórico de adimplência sólida”, projeta. O ajuste trará concentração no setor. “É um ajuste necessário, mas que trará concentração: cooperativas fortes e tradings capitalizadas ganharão espaço nas regiões onde revendas médias sofrem”, conclui a análise.

A Belagrícola obteve tutela cautelar na Justiça de Londrina em 10 de outubro, suspendendo pagamentos a credores e fixação de preço de grãos por 60 dias. A empresa, controlada pelo grupo chinês Pengdu, tem 52 filiais para revenda de insumos e capacidade de armazenamento de 1,5 milhão de toneladas em 58 silos, sendo 40 próprios. O último balanço anual, referente ao ano fiscal de 2024, mostrou receita de R$ 4,7 bilhões e prejuízo líquido superior a R$ 400 milhões. A distribuidora informou ao Broadcast Agro que “como outras empresas do agro, tem sido fortemente impactada por desafios econômicos e climáticos, incluindo inadimplência elevada, e por isso foi preciso avaliar alternativas para reorganizar suas finanças”.

Contato: gabriel.azevedo@estadao.com

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