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Bastidores: PT muda estratégia, põe Tarcísio como alvo, mas quer Lula fora da linha de frente

24 de setembro de 2025

Por Bianca Gomes e Pedro Augusto Figueiredo, do Estadão

São Paulo, 24/09/2025 – Refratário até aqui à ideia de antecipar um embate com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), o PT recalculou a rota. A ordem de conter a artilharia deu lugar à decisão de transformá-lo em alvo.

A estratégia prevê que dirigentes e parlamentares petistas assumam a linha de frente da ofensiva. Integrantes da cúpula da legenda defendem que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) evite o embate direto para não acabar projetando nacionalmente o adversário, ainda desconhecido de boa parte da população.

Até o mês passado, dirigentes petistas ouvidos reservadamente pelo Estadão defendiam poupar ataques ao governador para não gastar munição antes da hora. Eles alegavam dois riscos: além da possibilidade de o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) optar por outro nome, como o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) ou a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL), a ofensiva poderia acabar colocando o governador em evidência.

A estratégia mudou após as últimas movimentações do governador. Além de se envolver diretamente na articulação do projeto de anistia aos envolvidos nos ataques de 8 de janeiro, deixando de atuar somente no plano estadual, Tarcísio radicalizou seu discurso e fez acenos ao bolsonarismo na manifestação de 7 de Setembro, quando chamou o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de “ditador”.

A avaliação no PT é que Tarcísio tem acumulado erros e se colocado na linha de tiro. Por isso, o partido considera que é preciso aproveitar o momento para desgastá-lo.

Um exemplo da estratégia aparece nas inserções de rádio e TV do partido. O PT nacionalizou as peças veiculadas nos Estados, tratando sobretudo de temas nacionais e da gestão Lula. Em São Paulo, porém, abriu uma exceção e exibiu propaganda voltada exclusivamente a atacar o governador.

O vídeo diz que o governo de São Paulo “está do lado do Trump e dos bilionários”, critica a privatização da Sabesp e o preço dos pedágios no estado.

“Enquanto isso, o governo do Brasil trabalha para zerar o imposto de renda de quem ganha menos, faz obras estruturantes e negocia com o mundo para proteger empregos. Essa é a diferença”, diz a peça publicitária.

Auxiliares de Tarcísio veem na postura dos petistas uma tentativa de semear a discórdia no bolsonarismo. Nessa visão, tratar o governador como candidato também o coloca na mira de eleitores mais fiéis de Bolsonaro que ainda enxergam o ex-presidente como candidato e rotulam qualquer movimentação em sentido contrário como traição.

O Palácio dos Bandeirantes também registrou nas últimas semanas movimentos coordenados nas redes sociais para criticar Tarcísio. Um dos assuntos explorados foi a operação do Ministério Público de São Paulo contra fraudes na liberação de créditos de ICMS pela Secretaria de Fazenda paulista.

O deputado estadual Lucas Bove (PL), bolsonarista e aliado de Tarcísio na Alesp, afirma ter notado uma postura mais agressiva do PT em relação ao governador na Casa.

“Existe, sem dúvida nenhuma, um movimento de endurecimento do PT em relação ao Tarcísio”, diz ele, acrescentando que o partido tem criado obstáculos ao governador até em pautas menos ideológicas ou pouco ligadas diretamente ao mandato.

“A indicação de Wagner Rosário ao Tribunal de Contas do Estado, por exemplo, eles estão há semanas travando a pauta por causa disso, enquanto temos projetos importantes para votar”, diz ele. Rosário teve o nome aprovado nesta terça-feira, 23.

O deputado ainda acrescenta:

“Os partidos de esquerda, que o tempo todo faziam uma oposição de festim aqui, agora estão endurecendo porque sabem que, sendo Bolsonaro o candidato, o Tarcísio é um grande outdoor de campanha, já que representa a continuação do trabalho do Bolsonaro que fez sucesso em São Paulo. Não sendo Bolsonaro o candidato, eles sabem que o Tarcísio é um forte concorrente. O que mudou de antes para agora? Nada. O Tarcísio é o mesmo. São simplesmente questões eleitoreiras.”

Secretário de Comunicação do PT, Éden Valadares afirma que o partido “não escala o time adversário” e que tem um projeto para o Brasil, representado por Lula.

“Já a turma da direita e extrema direita não tem candidato e muito menos um programa de governo. Se vai ser um dos filhos de Bolsonaro ou se vai ser um dos governadores bolsonaristas, isso nem eles sabem, nem a gente. E, sinceramente, isso não nos pauta”, diz Valadares, acrescentando que “o vazio de ideias e de candidatura no campo da oposição é um problema da direita”.

O fim da lua de mel entre Tarcísio e Lula

Até pouco tempo atrás, Lula repetia a análise do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) de que Tarcísio não abriria mão de uma reeleição praticamente garantida em São Paulo para uma aventura incerta rumo à Presidência. Agora, porém, o petista afirma que o governador será seu adversário em 2026. Na visão de Lula, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), condenado pelo STF a 27 anos e 3 meses de prisão por golpe de Estado, não terá alternativa senão apostar no aliado paulista.

Essa leitura de Lula vinha sendo feita em conversas reservadas com correligionários próximos, mas, no mês passado, o presidente levou o diagnóstico à reunião ministerial do governo, onde também reafirmou que disputará a reeleição.

No início de seus mandatos, Lula e Tarcísio mantiveram uma relação cordial e chegaram a trocar afagos em fevereiro de 2024, durante a assinatura de um termo de cooperação técnica para a construção do túnel Santos-Guarujá. Agora, porém, petistas afirmam que a lua de mel acabou.

Nos últimos meses, o presidente tem deixado explícito o incômodo com as críticas do governador. Em um evento do BTG Pactual, o governador afirmou que o Brasil está há “40 anos discutindo a mesma pessoa” para comandar o País e não precisa mais de uma “mentalidade atrasada”.

O mal-estar não se restringe às falas públicas: no Planalto, aliados de Lula acusam o governador de agir de forma desleal ao disputar a paternidade do túnel Santos-Guarujá. A reclamação é que o governador esconde, em publicações oficiais, que a obra é fruto de uma parceria com a gestão federal.

Segundo interlocutores, o presidente tem se mostrado receptivo às críticas feitas a Tarcísio por seus próprios aliados. Um ministro relatou, em caráter reservado, que no passado havia sido repreendido por auxiliares de Lula ao criticar Tarcísio, mas recentemente recebeu o sinal de que manifestações desse tipo passaram a ser bem-vistas pelo Planalto.

A direção nacional do PT deu aval para ampliar a ofensiva contra Tarcísio, e caberá ao diretório paulista articular novas iniciativas além das inserções na TV. Algumas já começaram a ser colocadas em prática na Assembleia Legislativa de São Paulo.

Na semana passada, os deputados Antonio Donato (PT), líder da federação PT/PCdoB/PV, juntamente com o deputado Guilherme Cortez (PSOL), líder da Federação PSOL/Rede, protocolaram um pedido de impeachment contra o governador, sob a acusação de violação dos “pactos constitucionais” e de uso de recursos públicos para constranger e hostilizar autoridades do Poder Judiciário.

Sob a liderança da deputada Thainara Faria (PT), que comanda a minoria, a bancada tem buscado atuar de forma mais articulada, especialmente nas redes sociais. A avaliação interna é que a oposição precisa concentrar fogo na comunicação, já que Tarcísio tem maioria na Casa e conseguiu aprovar todos os projetos enviados até agora.

A bancada do PT tem feito reuniões semanais para organizar a produção de conteúdo contra o governo paulista nas redes sociais. Os encontros têm girado em torno de temas que os deputados de oposição consideram sensíveis à população, como os pedágios free flow e os impactos da privatização da Sabesp.

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