15 de setembro de 2025
Por Guilherme Caetano, do Estadão
Brasília, 15/09/2025 – Com Jair Bolsonaro condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a 27 anos e três meses de prisão, o bolsonarismo deve abrir ao menos três frentes de batalha para tentar salvar o ex-presidente e contra-atacar o Judiciário: duas no Congresso e uma no âmbito internacional, em especial nos Estados Unidos de Donald Trump.
O deputado Luciano Zucco (PL-RS), líder da oposição e o aliado de Bolsonaro mais presente na plateia da Primeira Turma do STF durante o julgamento, avalia que a “brecha jurídica” aberta pelo voto dissidente do ministro Luiz Fux deve ser usada para tentar reverter o quadro do ex-presidente.
Fux foi o único dos cinco ministros que compõem a Primeira Turma do STF que repetiu as alegações apresentadas pelas defesas, votou pela nulidade do processo e rechaçou o teor golpista dos episódios que precederam o 8 de Janeiro. Os demais ministros condenaram Bolsonaro e outros sete réus do “núcleo crucial” da trama golpista pelos crimes de organização criminosa, tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de direito, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
A saída traçada pelos bolsonaristas para salvar o ex-presidente passaria por instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista – com deputados e senadores – para investigar eventuais abusos e irregularidades do Poder Judiciário. A empreitada tem apoio até mesmo da ala moderada do bolsonarismo, como o senador Marcos Pontes (PL-SP).
A ideia da CPI nasce do crescente sentimento entre os bolsonaristas de que o julgamento encerrado no último dia 11 de setembro foi um “jogo de cartas marcadas” entre magistrados que querem perseguir o ex-presidente.
“O poder corrompido não trata quem pensa diferente como adversário, mas como inimigo a ser eliminado. Nesse cenário, uma reorganização e fortalecimento (do bolsonarismo) são necessários. Assim como o Brasil precisa estar livre, todos os presos políticos – incluindo Bolsonaro – também precisam. É por essa liberdade que trabalharemos”, diz a deputada Júlia Zanatta (PL-SC).
Site monitora adesão à CPI
Os bolsonaristas têm mantido um site, registrado no nome do deputado Gustavo Gayer (PL-GO), para monitorar a adesão dos parlamentares à ideia de criação da CPI e pressionar os demais. O placar apontava, na tarde da sexta-feira, 12, um total de 184 assinaturas a favor nas duas Casas, 145 contrários e 284 indefinidos. Zucco diz estar reunindo as últimas assinaturas necessárias para protocolar o pedido de instalação da comissão.
“Nós temos discutido a CPI da Vaza Toga. A gente entende que, como não temos como recorrer em nenhuma instância (dentro do Brasil), possamos levar isso para tribunais internacionais. Vamos tratar com o Filipe Barros (presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara) a possibilidade de ida de parlamentares ao parlamento americano, a entidades jurídicas internacionais, para levar as denúncias”, afirma ele.
Nessa frente internacional mencionada por Zucco estaria a articulação que vem sendo feita pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e pelo comunicador Paulo Figueiredo. Os dois têm feito reuniões em Washington para pressionar a Casa Branca a sancionar ministros do STF e tentar impedir punições contra o ex-presidente.
“Só há uma postura possível (a partir da condenação): uma luta incessante em cada front por uma anistia ampla, geral e irrestrita. Congresso, governos, Estados, lideranças religiosas, comunicadores, setor empresarial e, claro, os Estados Unidos com os demais países da comunidade internacional”, diz Figueiredo, questionado pelo Estadão/Broadcast Político sobre qual frente priorizar.
Os Estados Unidos aparecem como nova fronteira da direita brasileira, uma vez que Trump já demonstrou, na ocasião do tarifaço e da imposição da Lei Magnitsky contra o ministro do STF Alexandre de Moraes, estar atento ao julgamento de Bolsonaro e que pode usá-lo como munição para outra ofensiva contra o Brasil.
O Partido Liberal (PL) vê surgir mais uma vez, após sucessivos fracassos, um novo momento político para avançar com a anistia. A bancada federal vai se reunir na terça-feira, 16, para definir as estratégias de atuação e espera ver o tema ser pautado no Colégio de Líderes no mesmo dia.
Apesar da pressão bolsonarista, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), vem fazendo o que pode para empurrar a discussão da anistia. Ele segue sem dar previsão de votação nem indicar relator para o tema.
Até integrantes do Centrão que na semana passada haviam decidido endossar a demanda bolsonarista agora veem um perdão ao ex-presidente como menos provável. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), é outro a tentar baixar a fervura da articulação – ele afirmou que iria elaborar a própria proposta de anistia, mas até hoje nada avançou.
Recados do STF sobre a anistia
No julgamento de Bolsonaro, o STF passou seus recados sobre o projeto. A sessão final na Primeira Turma foi marcada por uma tentativa de enterrar os planos de anistiar o ex-presidente. Antes de sugerir a pena, Moraes defendeu uma “resposta estatal” dura para inibir novas intenções golpistas.
“As circunstâncias judiciais devem ser analisadas para evitar a reiteração de uma histórica repetição em nosso País da transformação de grupos políticos, com apoio de determinados setores das Forças Armadas, em organizações criminosas”, disse.
Além do ex-presidente, o delator Mauro Cid foi condenado a 2 anos em regime aberto. Ao definir a pena, Moraes acatou alguns benefícios firmados no acordo de delação premiada, mas negou o pedido de perdão judicial – alegando que crimes contra a democracia não permitem anistia.
“Assim como não cabe anistia, porque são espécies do mesmo gênero constitucional, também não cabe perdão judicial. Não cabe indulto pelo presidente, anistia pelo Congresso e também não cabe perdão judicial pelo Judiciário em crimes de golpe de Estado”, afirmou.
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