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Pine/Cristiano Oliveira: BC já poderia começar a cortar Selic, mas Fed não deveria reduzir juro

5 de dezembro de 2025

Por Arícia Martins e Francisco Carlos de Assis

Com uma visão mais ‘dovish’ do que o consenso de mercado para a trajetória do juro básico no Brasil, o diretor de pesquisa econômica do banco Pine, Cristiano Oliveira, defende há um bom tempo que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central já tem condições técnicas para cortar a Selic na reunião da próxima quarta-feira, na qual a taxa deve ser mantida em 15% ao ano. Já sobre a postura do Federal Reserve (Fed), sua avaliação é totalmente contrária: “a curva ainda precifica mais três quedas do juro nos Estados Unidos além da próxima, mas elas não deveriam ocorrer”, defendeu Oliveira em conversa com a Broadcast.

Conforme a expectativa praticamente consensual dos agentes, o diretor prevê que o Comitê de Mercado Aberto (FOMC, na sigla em inglês) vai reduzir a meta para a taxa dos Fed Funds em 0,25 ponto porcentual no encontro da próxima semana, que coincide com o do Copom por aqui. Mas, para ele, essa não seria a abordagem correta para a maior economia do mundo no momento, e o banco central americano também não deveria ter reduzido os juros em outubro – tampouco deveria prosseguir no ciclo de alívio monetário.

“Vai ser a terceira queda em uma economia que ainda cresce acima do potencial e em que só recentemente a taxa de desemprego encostou na Nairu [sigla em inglês para taxa de desemprego de equilíbrio, que não acelera nem desacelera a inflação]. E a inflação ainda vai aparecer”, alerta o economista.

Com a política anti-imigrantes do presidente Donald Trump, que recentemente suspendeu todos os pedidos de imigração de cidadãos de 19 países, há uma redução de oferta de mão de obra que acaba por elevar os custos salariais, o que se traduz em aumento de preços, afirmou. Também com impacto altista sobre a inflação, a tendência de fraqueza do dólar ante outras moedas, provocada pelas medidas econômicas do republicano, deve continuar, acrescenta. “Trump foi bom para moedas emergentes”.

Há, por fim, o efeito das tarifas comerciais impostas a uma série de países – que não são necessariamente inflacionárias, uma vez que a inflação se caracteriza por um aumento contínuo de preços -, mas pode acabar por pressionar os índices de preços, observou o diretor do Pine. “A inflação nos Estados Unidos é uma questão não resolvida”, avalia.

Já por aqui, o quadro é inverso, de acordo com Oliveira. O arrefecimento da inflação e da atividade – que, com o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre, trouxe sinais irrefutáveis de que a política monetária está segurando a demanda -, e mesmo o mercado de trabalho, último elo da economia a sentir o impacto da restrição do juro, conspiram a favor do início do processo de alívio monetário.

Segundo Oliveira, a única surpresa da instituição em relação ao PIB trimestral, publicado ontem pelo IBGE, veio do consumo das famílias, que cresceu apenas 0,1% em relação aos três meses anteriores, feitos os ajustes sazonais. Tanto no primeiro quanto no segundo trimestres, a alta nessa comparação foi de 0,6%.

Pela ótica da oferta, o economista destaca a perda de ímpeto do PIB dos serviços, que também subiu apenas 0,1% no terceiro trimestre, na margem, depois de ter avançado 0,3% de abril a junho, e 1% nos três primeiros meses de 2025. “O consumo menor é a combinação de um mercado de trabalho em desaceleração, da política monetária atuando muito pelo canal de crédito e do endividamento das famílias em alta”, disse.

Em relação ao mercado de trabalho, ainda visto como sobreaquecido por muitos economistas, o diretor de pesquisa econômica ressalta que, embora a taxa de desemprego continue nas mínimas históricas – em 5,4% no trimestre móvel terminado em outubro -, o crescimento da massa salarial desacelerou, e o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) também traz sinais de moderação.

“A prova do pudim é a inflação”, diz Oliveira, que, em sua percepção, também já abriria espaço para um corte de juros ainda em 2025. Isso porque a média dos cinco principais núcleos acompanhados pelo BC gira em nível próximo ao do centro da meta, de 3%, entre 2,75% e 3,5%. “Nos EUA, seria para cima, mas aqui dá para ser mais baixista nos juros.”

Para fechar a equação bastante propícia a um ciclo de afrouxamento monetário, a taxa de câmbio deve continuar se apreciando nas projeções do Pine, encerrando 2025 e 2026 em R$ 5,20, o que alivia a dinâmica de preços. Vão ajudar nessa trajetória, de acordo com o economista, a tendência global de enfraquecimento da divisa americana, o diferencial de juros elevado, que aumenta operações de ‘carry trade’, e a solidez das contas externas. “Nunca compramos uma narrativa de real depreciado ao longo do ano”.

Tendo em vista essa conjuntura, Oliveira projeta que a Selic vai terminar 2026 em 11,5% ao ano – número abaixo do consenso do boletim Focus, de 12,25%. O ciclo de cortes deve começar em janeiro, com uma redução de 0,25 ponto porcentual, que ganha ritmo ao longo do ano.

Para o PIB, o Pine trabalha com expansão de 2,2% em 2025 e 1,8% em 2026. Ambos os números têm viés de alta, mas o diretor destaca que dados um pouco mais positivos não seriam impeditivos ao cenário de queda para a Selic. “Continuamos otimistas com o Brasil, e menos otimistas com o resto do mundo”, resume Oliveira.

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