18 de novembro de 2025
Por Cristiane Barbieri, do Estadão
São Paulo, 18/11/2025 – Daniel Vorcaro, o dono do Master preso nesta terça-feira, 18, quando tentava fugir para o exterior num jatinho, em uma operação da Polícia Federal para apurar suspeitas de crimes envolvendo a venda do banco, tem como hábito dizer, em entrevistas, ser um banqueiro que jamais foi aceito pela Faria Lima, o habitat natural dos participantes do mercado financeiro.
Ao construir o que seria, em sua visão, um banco bem-sucedido em pouquíssimo tempo, teria sido rejeitado pelos pares, provenientes de negócios mais tradicionais – e por eles boicotado.
Com a liquidação do Banco Master pelo Banco Central (BC) na manhã desta terça-feira, 18, ele foi afastado da instituição, como determina a legislação. Após a apuração pela autoridade monetária de sua eventual responsabilidade por atos ilícitos ou de má gestão, poderá ou não ser banido do mercado financeiro.
O mineiro Vorcaro, hoje com 41 anos, tem certa razão ao afirmar que jamais foi aceito na Faria Lima. Há alguns anos, seu nome é obrigatório em conversas informais com banqueiros e executivos que frequentam a região. Na maioria das vezes, pela falta de sentido ou de prudência com que conduzia o negócio.
Outras, por sua vida social. Além de fazer investimentos como pessoa física que chamaram a atenção ao se tornarem públicos, ele tem presença ativa em redes sociais. Posts em que aparece com sua namorada, a influenciadora Martha Graeff, viralizam quase que instantaneamente na Faria Lima.
Essa exposição pública acontecia mesmo em meio à crise que o Master já atravessava, desde que sua venda ao Banco de Brasília veio a público, em março deste ano. Vorcaro aparecia em diferentes partes do mundo ao lado de Martha, sempre em meio a muito glamour e durante os meses de negociações mais intensas.
Segundo o colunista Lauro Jardim, de “O Globo”, em julho, um vídeo de Vorcaro se divertindo num beach club em Saint Tropez circulou em WhatsApp de banqueiros. Vorcaro havia acabado de passar dois finais de semana reunidos com a direção do BC para negociar a venda ao BRB. Mesmo assim, teria usado um jato privado para, no intervalo, aproveitar um pouco do verão europeu.
Foi esse mesmo estilo de pouca discrição que Vorcaro tentou usar para que o Master fosse aceito na Faria Lima. Inicialmente, colocou o banco num dos endereços mais nobres da região, no mesmo prédio onde funcionam o Google e o BTG. Reformou os dois andares mais altos no prédio da Baleia, como seu escritório pessoal.
Também patrocinou pesadamente sites de notícias e, no ano passado, o Master tinha dois dos maiores estandes na Expert XP, a meca do mercado brasileiro, que reúne 50 mil participantes, entre gestoras, bancos e investidores em três dias, em São Paulo. Campanhas de mídia com a atriz Ísis Valverde como protagonista lançaram a marca Master, em horário nobre na TV, em 2021.
Porém, o jeito pouco ortodoxo de fazer negócios jamais foi bem-aceito pelos pares de Vorcaro. Nessas conversas informais com participantes do mercado, quando o tema Master aparecia, a frase que geralmente encerrava o papo era: “Não sei o que vai acontecer no meio do caminho, mas o fim dessa história dá para prever”. A impressão geral era que o negócio não pararia em pé por muito mais tempo. A liquidação do banco, no entanto, jamais era dada como favas contadas. Motivo: Vorcaro é muitíssimo bem-relacionado.
Como mostrou o Estadão, Vorcaro criou conexões que vão de ministros de Lula a aliados de Bolsonaro. Ele ascendeu mais rápido no meio político do que no mercado, com patrocínio a eventos no Brasil e no exterior, bem como encontros frequentes com lideranças de Brasília. O Master também tinha um “comitê de notáveis”, como os ex-presidentes do BC Henrique Meirelles e Gustavo Loyola, e outras frentes em que buscava fortalecer sua imagem.
Essas conexões foram apontadas como um dos principais motivos tanto para a ascensão meteórica de Vorcaro, como para o anúncio de compra do Master pelo estatal BRB ter sido levado adiante, mesmo com todos – inclusive antes da venda – sabendo os problemas nos quais a instituição estava envolvida.
No anúncio original do negócio, inclusive, Vorcaro e o Master permaneceria com vida própria, com a instituição funcionando de maneira separada do BRB. O governador do DF, Ibaneis Rocha, veio a público diferentes vezes defender o negócio.
A pressão para aprovação da operação era grande, inclusive com a tentativa de aprovação de um projeto de lei – posteriormente derrubado – que permitiria a demissão de diretores do BC pelo Congresso. Isso porque a autoridade monetária ameaçava vetar o negócio, o foi feito na mesma época em que o projeto de lei foi anunciado.
Problemas antes, durante e depois
Vorcaro começou o Master há menos de dez anos, em 2016, com a compra de uma participação no banco Máxima. Envolvido num esquema de desvio de recursos de previdências municipais entre 2010 e 2017, o Máxima foi alvo da Operação “Fundo Fake”, da Polícia Federal.
Apesar de, nesse período, o Máxima ainda não estar nas mãos de Vorcaro, a investigação da Polícia Federal e do Ministério Público apurou que parte do dinheiro do Máxima era aplicado em fundos e empresas nas quais ele tinha participação. A esses questionamentos, ele respondia com uma decisão judicial que não viu indícios de sua autoria e prática delitiva nesse caso de fraudes com planos de pensão.
A partir de 2021, o Master cresceu agressivamente em algumas frentes, sendo a principal a venda de CDBs que pagavam 140% do CDI ao investidor pessoa física. Na prática, isso quer dizer que o papel do Master (o CDB) pagava 40% a mais do que a taxa referencial do mercado (o CDI), graças ao Fundo Garantidor de Créditos (FGC).
Essa estrutura garante que depósitos de pequenos investidores (em até R$ 250 mil) sejam pagos em caso de quebra do banco. Essa segurança era o principal argumento de venda dos CDBs de um banco relativamente desconhecido, nas propagandas do produto.
Quando as captações com CDBs começaram a secar por força de regulamentação, os papéis do Master passaram a ser oferecidos a fundos de pensão estaduais e municipais. Como mostrou o Estadão, apenas a RioPrevidência, fundo de pensão dos funcionários do Estado do Rio de Janeiro, tem quase R$ 1 bilhão em letras financeiras do Master, que não estarão garantidos pelo FGC. Pelo menos 12 fundos de pensão e outros investidores, como o Banco da Amazônia (Basa), correm o risco de levar um calote de R$ 3 bilhões.
Com o dinheiro captado, o Master comprava participações em empresas. Muitas delas, com problemas. Apesar da promessa de retornos maiores, o tempo em que eventualmente o dinheiro seria recuperado era descasado dos compromissos que o banco tinha com seus correntistas.
Quando a negociação com o BRB começou a emperrar, Vorcaro passou a vender ativos. Parte de seus bens pessoais, em torno de R$ 1,5 bilhão, foi vendido ao BTG.
Antes mesmo da necessidade de venda do Master se tornar pública, Vorcaro era conhecido por ostentar. Comprou o Fasano Itaim como pessoa física (que venderia ao BTG), investiu no Clube Atlético Mineiro e fez uma festa de debutante estimada em R$ 15 milhões para sua filha, que também viralizou nas redes sociais.
Vorcaro teria gasto R$ 15 milhões na festa realizada no Condomínio Miguelão, na cidade de Nova Lima (MG). Ele asfaltou a estrada de terra que dá entrada ao condomínio, paralela à BR-040, e, aos vizinhos, teria oferecido cestas e diárias no Fasano Belo Horizonte, caso se incomodassem com a celebração. No palco, DJs como The Chainsmokers e Alok animaram a comemoração.
Em 2023, sua família teria comprado a mansão mais cara já negociada em Orlando e da Flórida Central, por US$ 37 milhões. A casa tem 3,5 mil m² de área construída, com quadra oficial de basquete, pista de boliche e campo de futebol. Também uma mansão em Trancoso.
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