30 de setembro de 2025
Por Daniel Weterman, do Estadão
Brasília, 30/09/2025 – O Congresso Nacional quer exigir do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) um congelamento de gastos pelo centro da meta fiscal em 2026, ano de eleições presidenciais, reforçando um entendimento do Tribunal de Contas da União (TCU), com prioridade para o pagamento de emendas parlamentares.
A decisão pode obrigar o governo a congelar até R$ 34 bilhões a mais em gastos em ano eleitoral com uma fórmula que desfavorece o Poder Executivo e privilegia o interesse dos parlamentares: o governo seria obrigado a cortar despesas dos ministérios e priorizar as emendas quando houver dinheiro disponível.
Uma medida nesse sentido foi colocada no relatório da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2026. O projeto seria votado nesta terça-feira, 30, na Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso, mas a votação foi adiada para semana que vem. Procurados, os ministérios da Fazenda e do Planejamento não comentaram.
O governo tem uma meta fiscal de equilíbrio das contas públicas entre receitas e despesas. Essa meta, porém, tem um intervalo de tolerância para cima e para baixo desde a aprovação do arcabouço fiscal, em 2023. O governo tem mirado no piso inferior, o que abre margem para mais gastos.
No entendimento da equipe econômica, há uma regra na Constituição Federal que exige a execução do Orçamento da União para entrega de políticas públicas, portanto, o corte deve ser o menor possível, no limite das regras fiscais, para não ferir essa lei maior.
O TCU, no entanto, entendeu diferente em uma decisão na semana passada. Um dispositivo na LDO de 2025 diz que, na hora em que o governo faz o cálculo para decidir se precisa ou não segurar os gastos, deve mirar no centro da meta, e não no piso. A mesma redação está sendo repetida na LDO de 2026.
O governo se comprometeu a entregar um superávit primário de 0,25% do PIB, ou R$ 34,3 bilhões no azul, em 2026. Com o piso da meta, o objetivo cai para um déficit zero, o que exige um esforço fiscal menor.
Ao mandar o projeto da LDO para o Legislativo, o governo propôs uma redação que reforça o uso da tolerância pelo piso, mas o relator, deputado Gervásio Maia (PSB-PB), alterou e propôs a regra mais rígida. Ainda há debates se essa redação realmente obrigaria o governo a fazer um congelamento maior de despesas – porque a mesma LDO admite a tolerância.
O presidente da CMO, senador Efraim Filho (União-PB), disse ao Estadão que a tendência é o colegiado aprovar o relatório de Gervásio Maia, obrigando o governo a mirar no centro da meta. Depois, o texto passará pelo plenário. O governo ainda pode tentar ajustar o texto.
O deputado Gervásio Maia, que é da base do governo Lula no Congresso, colocou o dispositivo na LDO atendendo a duas emendas, uma da Comissão de Transparência, Fiscalização e Controle do Senado e outra da senadora Damares Alves (Republicanos-DF).
Outros congressistas da oposição apresentaram sugestões ainda mais rígidas, com redações mais claras de que o governo só deveria considerar o centro da meta sem o piso de tolerância, mas elas não foram atendidas.
Articuladores do governo começaram a procurar parlamentares para evitar um entendimento que leve ao centro da meta fiscal de forma obrigatória. Há dois caminhos sendo discutidos: deixar isso claro na LDO ou manter o conteúdo proposto pelo relator, mas com uma interpretação mais flexível – que dependeria também de mudança de decisão do TCU. O governo recorreu ao tribunal para alterar o entendimento da Corte de contas.
Parlamentares querem calendário de pagamento de emendas antes das eleições
A proposta do Congresso é um revés para a equipe econômica, mas essa não é a única notícia negativa para o governo na LDO. Os parlamentares também querem aprovar um calendário de pagamento de emendas, conforme o Broadcast Político já noticiou, para forçar o governo a pagar todos os repasses de emendas Pix e para fundos de saúde e assistência social – que juntos compõem a maior fatia das emendas – até julho, três meses antes das eleições presidenciais.
O governo é contra esse calendário rígido porque, na prática, o funcionamento atual da máquina impede o pagamento integral de emendas no primeiro semestre do ano – o normal, na verdade, é acontecer o inverso, que várias emendas só sejam pagas no fim do ano ou fiquem “penduradas” para o ano seguinte, à espera de caixa disponível ou de avanço nos projetos e obras.
O calendário é cobiçado pelo Congresso porque a lei eleitoral proíbe o pagamento de emendas três meses antes da eleição até o dia do pleito, com exceção de obras em andamento. Além da eleição presidencial, haverá eleição para deputados e senadores, os padrinhos dos recursos direcionados aos redutos políticos.
O prazo obrigatória não protegeria as emendas do congelamento de gastos, mas daria uma prioridade para esses repasses quando houver dinheiro disponível.
Nas eleições municipais de 2024, o Congresso também aprovou um calendário, mas o presidente Lula vetou. Após idas e vindas, o governo acabou negociando um pagamento com base em um decreto e transferiu um valor recorde de aproximadamente R$ 30 bilhões em emendas antes da eleição.
“A participação do Legislativo na apreciação do projeto de lei permite engrandecer as diretrizes para a elaboração e a execução dos orçamentos da União”, escreveu o relator da LDO no parecer ao justificar as mudanças sobre emendas. “As diretrizes exaradas não podem deixar de dispor sobre emendas ao projeto de lei orçamentária, bem como sobre a forma como devem ser executadas as dotações criadas ou ampliadas por iniciativa parlamentar.”
A negociação deve ser política e envolver diretamente o presidente Lula. Enquanto isso, a equipe econômica preparou um mecanismo de contenção de danos em outro projeto, na Lei Orçamentária Anual (LOA), que ainda não foi votada. O Executivo propôs o cancelamento de emendas para cumprir o arcabouço fiscal sem necessidade de o governo consultar o Congresso ou os autores das emendas. Atualmente, essa prática é limitada e está ancorada em uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
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