Caxambu, Minas Gerais--(
DINO - 31 out, 2016) - Após quatro dias de intensa programação, terminou na última quinta, dia 27, o 40º Encontro Anual da ANPOCS (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais). A cerimônia de encerramento contou com a premiação de teses, dissertações, obras científicas, vídeos e ensaios fotográficos. Já a assembleia final elegeu a nova diretoria da ANPOCS, que fará a gestão da associação pelos próximos 2 anos.
Para José Ricardo Ramalho, presidente da entidade, este encontro da ANPOCS confirmou a vitalidade da comunidade de Ciências Sociais no Brasil, com um número de participantes maior que em anos anteriores ? foram 1374 inscritos no total. "Foi um encontro sensível ao que está acontecendo no país, apresentando alternativas e também discutindo como enfrentar os problemas atuais", disse.
Esta edição do evento também celebrou os 40 anos da ANPOCS, que se consolida a partir de um crescimento expressivo dos programas de pós-graduação no Brasil. "Espero que nos próximos anos a ANPOCS continue produzindo conhecimento sobre os problemas do país, as alternativas para solucioná-los, e que prevaleça sendo uma referência para as Ciências Sociais do Brasil", destaca Ramalho.
Durante o encerramento ocorreu a premiação dos ganhadores do Concurso Brasileiro ANPOCS de Obras Científicas e Teses Universitárias em Ciências Sociais. Este ano, o prêmio de melhor obra científica ficou com a publicação "O Impeachment de Fernando Collor: sociologia de uma crise" (Editora 34), do sociólogo Brasílio Sallum Jr.
A publicação busca explicar por que o primeiro presidente eleito no país, depois de 1988, com uma enorme quantidade de votos, sofreu, dois anos após sua eleição, um processo de impeachment ? uma novidade no Brasil e na América Latina, já que nenhum presidente eleito havia sido impedido na região até então.
O livro começa com um balanço do processo de redemocratização do país, que ocorre nos anos 80 e levanta as principais questões em debate à época da Assembleia Constituinte. Depois passa a analisar o governo de Fernando Collor, mostrando como, paulatinamente, o presidente vai perdendo capacidade de conduzir o processo político, especialmente, no que diz respeito à articulação junto ao Congresso nacional.
"A ideia foi destacar o processo social que produziu o impeachment. Porque ninguém cai de uma Presidência por acaso. Trata-se de um processo longo, que no caso dele, começou nos primeiros meses de mandato, com a crítica às medidas provisórias que vinham sendo editadas por ele sem a mediação com as forças políticas que estavam no legislativo ? o que já no primeiro ano gerou resistências", afirma Salum Jr.
O prêmio de melhor tese foi para "Mudanças nas famílias brasileiras (1976-2012): uma perspectiva de classe e gênero", de Nathalie Reis Itaboraí. A partir dos dados das PNADs (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), a pesquisa ? orientada por Nelson do Valle Silva no IESP/UERJ ? analisa o processo de emancipação das mulheres por meio das mudanças ocorridas nas famílias nas diferentes classes sociais. Redução de fecundidade, maior presença de mulheres no mercado de trabalho, menor diferença salarial e de idade entre mulheres e seus cônjuges e maior nível de escolaridade feminina foram observados à luz das transformações da vida familiar.
"É importante destacar que a redução da fecundidade ocorre em todas as classes sociais, inclusive, nas classes baixas", contou a pesquisadora, se contrapondo ao mito de que famílias de menor renda têm mais filhos para se beneficiar de programas sociais. Ela destacou, ainda, a importância de uma estrutura de cuidados públicos (educação infantil, cuidado para idosos e pessoas com deficiência), que auxilie as mulheres no dia a dia, principalmente, as de classes mais baixas, que têm "menos possibilidades de terceirizar este cuidado, contratar empregada doméstica ou de pagar pela educação infantil".
Receberam menção honrosa as teses "Sobre casos e casamentos: afetos e "amores" através de penitenciárias femininas de São Paulo e Barcelona", de Natália Corazza Padovani, e "O alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos e seu escritório: criação e desenvolvimento institucional (1994-2014)", de Matheus de Carvalho Hernandez, ambos da Unicamp.
A melhor dissertação de mestrado foi "Do corpo ao pó: crônicas da territorialidade Kaiowá e Guarani nas adjacências da morte", produzida por Bruno Martins Morais sob orientação de Ana Claudia Duarte Rocha Marques, da FFLCH/USP. O estudo mostra os processos de violência sofridos por estes povos no Mato Grosso do Sul ? estado onde foram assassinadas mais de 40 lideranças indígenas em virtude do conflito pela terra.
"Existe uma dimensão muito trágica, uma dimensão de sofrimento na vida destas pessoas que é imposta pelas injustiças que nossa sociedade cometeu contra elas. Por outro lado, mesmo convivendo com esta destruição, sendo vizinhos da morte, como destaquei na dissertação, para estes povos há sempre uma possibilidade de refundação do mundo, um sentido de que coisas muitos ruins podem produzir coisas boas", contou. "E isto, de alguma forma, produz uma mensagem de esperança", conclui.
As dissertações "Por dentro dos gabinetes: organização e profissionalização das assessorias parlamentares na comunicação em mídias sociais", de Márcio Cunha, da UFPR, e "Confiança e desconfiança como dispositivos morais situacionais em trânsito: um estudo em viagens de ônibus na cidade do Rio de Janeiro" de Vittório da Gamma, da UFRJ, receberam menção honrosa do júri.
A 40º edição do Encontro ANPOCS premiou também os melhores painéis apresentados e realizou, pela primeira vez, a premiação de filmes e ensaios fotográficos. O filme vencedor foi "O legado da capivara", de Gabriel Banaggia de Souza, curta que conta histórias do "jarê", uma religião de matriz africana existente somente na Chapada Diamantina, Bahia. Já o melhor ensaio fotográfico foi "No toque do damam: superando divisões religiosas internas, conquistando direitos específicos", de Andreas Hofbauer.
Excelência Acadêmica
No dia 24 ocorreu a entrega do Prêmio ANPOCS de Excelência Acadêmica. Receberam a honraria: Luiz Antônio Machado da Silva (Sociologia); Helgio Trindade (Ciência Política); e Lux Boelitz Vidal (Antropologia). Criado em 2013, o Prêmio Anpocs busca reconhecer e premiar pesquisadores da área por suas contribuições acadêmicas, produção intelectual e trabalho institucional em prol das Ciências Sociais.
Website:
http://anpocs.org
