Economia & Mercados
18/09/2020 12:00

Latam tem caminho aberto para levantar financiamento de US$ 2,45 bi nos próximos dias


Por Cristian Favaro

São Paulo, 18/09/2020 - A aérea Latam deu um passo importante nesta quinta-feira para conseguir levantar recursos e enfrentar a pandemia de covid-19. O grupo fez ajustes na proposta de empréstimo no modelo DIP (debtor-in-possession, em inglês) de US$ 2,45 bilhões, a ser levantado com investidores e controladores dentro do processo de recuperação judicial (chapter 11) nos Estados Unidos. A avaliação de especialistas é que, sanados os questionamentos da Justiça daquele País, a empresa tem caminho aberto para receber um sinal verde em até 14 dias.

A empresa entrou em recuperação judicial nos Estados Unidos em maio. No modelo DIP, o credor que concedeu o recurso tem prioridade no recebimento perante os outros. O que a Justiça questionou, na verdade, foi a proposta de financiamento por parte dos controladores, de investimento na tranche C, que abria espaço para se converter o valor em ações com desconto de 20% - favorecendo os controladores em detrimento dos minoritários.

Desde a decisão negativa, no dia 11, a Latam se limitava a dizer que estava avaliando a manifestação do tribunal, que tinha mais de 100 páginas. A empresa divulgou, em fato relevante, que apresentou ao Tribunal do Distrito Sul de Nova York uma proposta modificada do financiamento DIP.

A nova proposta retirou da tranche C a cláusula que abria espaço para a conversão de ações em favor dos controladores. O grupo foi além. Agora, a tranche C será composta por até US$ 1,15 bilhão (antes era de até US$ 1,5 bilhão), sendo US$ 750 milhões fornecidos pela Qatar Airways e pelos Grupos Cueto e Eblen e US$ 250 milhões pela Knighthead Capital. Além disso, há a inclusão da participação de acionistas minoritários da Latam por até US$ 150 milhões. "Caso esse valor não seja atingido, o diferencial será fornecido pelos credores da Tranche C", explicou a empresa.

Já na tranche A, o valor de até US$ 1,3 bilhão continuará a ser liderado pela Oaktree Capital Management, L.P., que contribuirá com US$ 1,125 bilhão, enquanto a Knighthead Capital participará com US$ 175 milhões. "A Latam está aguardando determinação do Tribunal em relação à proposta de financiamento DIP modificada", disse a empresa.

O movimento da empresa confirmou a estimativa do mercado de que ela não tentaria recorrer da decisão do tribunal, conforme apontou o Broadcast em reportagens. A interpretação é que recorrer tomaria mais tempo e a empresa, assim como todo o setor aéreo, está com o caixa enfraquecido.

De acordo com Maria Fabiana Dominguez Sant'Ana, sócia do PGLaw, a decisão foi positiva para o grupo. "Por ter atendido às determinações do Juiz, principalmente com a questão da conversão, é muito provável que ela consiga a liberação", disse Sant'Ana. Ela explicou que a audiência pra se discutir o DIP, pela lei, tem de ocorrer em até 14 dias, mas que isso pode ser antecipado por causa da situação do setor aéreo.

Já o sócio de ASBZ Advogados e especialista em insolvência, Bruno Chiaradia, também viu com bons olhos o desfecho. "Não se esperava que a companhia se insurgisse contra a decisão, mas se adaptasse a ela", disse, e emendou: "acho que agora tem tudo para dar certo".

Chiaradia destacou, entretanto, que o grupo deixou em aberto no fato relevante a possibilidade de que a conversão em ações aconteça no futuro. "Não dá para saber o que eles planejam, mas me parece que eles deixaram uma brecha para mudar algo no plano e trazer algo parecido com o que foi negado", disse. Ele ponderou que nenhuma mudança muito brusca deve vir, uma vez que o processo de reestruturação tem de ser aprovado pelos credores.

No fato relevante, a empresa disse que a proposta não contempla a conversão de ações. Mas a Latam acrescenta: "Portanto, a menos que os termos do DIP sejam posteriormente modificados no plano de reorganização aprovado (...), os valores devidos sob a tranche A e tranche C serão pagos em dinheiro".

Com a pandemia, cada vez mais as aéreas tiveram de queimar caixa para fazer frente a custos fixos elevados. A Latam, em especial, tem forte atuação no mercado internacional, que tem demorado mais para se recuperar diante das restrições em diversos países. A empresa chegou a demitir cerca de 2,7 mil tripulantes para ajustar sua equipe à nova realidade do mercado.

Globalmente, a empresa teve um fator de utilização das aeronaves de 51% no segundo trimestre, queda de mais de 30 pontos porcentuais na comparação anual. O mercado doméstico brasileiro tem se recuperado de forma mais rápida do que nossos vizinhos na América Latina. Mesmo assim, a Latam se mostra mais fragilizada no País e apresentou, em julho, fator de utilização de 66% das aeronaves, contra 79% da Azul e 78% da Gol, conforme dados divulgados pela Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC).

No Brasil, o grupo deve ficar sem o suporte do governo. A Latam disse recentemente que debatia com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) uma ajuda via DIP. Especialistas, entretanto, demonstram ceticismo com a possibilidade de o banco embarcar no projeto. Isso porque Gol e Azul, que têm ações listadas no Brasil e atendem aos requisitos do banco para receberem cerca de R$ 2 bilhões cada, ainda não viram a cor do dinheiro. A operação nos EUA fez a Latam deixar a ajuda do governo brasileiro em segundo plano.

Contato: cristian.favaro@estadao.com
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