Economia & Mercados
21/07/2021 09:59

Especial: Desemprego, inflação e CPI descolam aprovação de Bolsonaro da retomada da atividade


Por Cícero Cotrim

São Paulo, 20/7/2021 - A reprovação ao presidente Jair Bolsonaro vem renovando máximas nas últimas pesquisas de opinião e deve se manter elevada nas próximas leituras, avaliam especialistas consultados pelo Broadcast. No curto prazo, a inflação e o desemprego altos impedem que o mandatário converta em aprovação a retomada da atividade. Por fim, o desgaste do governo com a gestão da pandemia pode sustentar os níveis de rejeição ao presidente.

A redução da popularidade do governo também sinaliza que Bolsonaro pode ter maior dificuldade ao buscar a reeleição em 2022. Um modelo do doutor em Estatística e fundador do PollingData, Neale Ahmed El-Dash, indica que Bolsonaro teria apenas 30% de probabilidade de se reeleger em uma disputa contra o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva (PT). O método transforma as pesquisas de avaliação do governo em métricas de aprovação e trata os resultados para mitigar o viés metodológico - um componente de erro que cada instituto adiciona à avaliação estimada.

"No geral, se a aprovação do governo for de 40%, a chance de reeleição é de 50%. Esse é o divisor de águas", explica El-Dash. "Lula tinha uma aprovação muito alta, por isso teve uma chance enorme de ser reeleito em 2006. Dilma [Rousseff, do PT] estava oscilando em torno de 40% em 2014 e vimos uma eleição muito apertada."





Mas retomar um nível de aprovação de 40% pode se mostrar tarefa complexa para Bolsonaro. O cientista político e sócio da Tendências Consultoria Integrada, Rafael Cortez, afirma que o desgaste do governo no front político, a inflação e o desemprego se impõem como entraves para que o presidente recupere o apoio dos eleitores de baixa renda.

"Mesmo se tivermos uma trajetória de crescimento, esse crescimento é, digamos, regressivo, reforça as desigualdades do País e não traz dividendos políticos por causa dessa natureza", diz Cortez. "Isso é tão forte que, mesmo em um quadro no qual o governo prorrogou o auxílio emergencial, isso não se traduziu em uma blindagem da avaliação em relação ao quadro político um pouco mais tortuoso."

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) calcula que a inflação das famílias de renda mais baixa atingiu nos 12 meses até junho 9,24%, quase 3 pontos porcentuais acima da taxa para as famílias de alta renda, de 6,45%. O IPCA, índice oficial de inflação no País, acumulou no período alta de 8,35%.



Neste cenário, as denúncias de má gestão da pandemia pelo governo ganharam uma caixa de ressonância com a instauração da CPI da Covid. A repercussão dos trabalhos do colegiado, aliada à postura crítica de Bolsonaro em relação às vacinas, têm impedido até que o presidente colha os dividendos políticos do avanço da vacinação contra a covid-19 no País, diz Cortez.

"A minha avaliação é que estamos chegando no piso da avaliação do governo: não acho que o cenário mais provável seja de deterioração adicional da popularidade, mas a rejeição pode aumentar. Por outro lado, esse desenho sugere uma alternância de poder em 2022, uma derrota na campanha de reeleição", diz Cortez.

Os modelos da XP Investimentos com base no seu cenário de atividade econômica sugerem recuperação da popularidade de Bolsonaro a um nível entre 40% e 45% até 2022. Mas o economista e analista político da XP Victor Scalet avalia que o mais provável é que os fatores políticos - em especial as denúncias de corrupção na CPI da Covid - impeçam o presidente de converter toda a melhora da economia em popularidade.

Desde abril, Scalet acompanha um movimento de quebra de correlação entre quatro variáveis na pesquisa da XP/Ipespe: a popularidade do governo, a percepção da economia, a opinião pública em relação ao medo da pandemia e a percepção das notícias em relação ao governo. Segundo o economista, a CPI da Covid parece ser responsável pelo descolamento entre as variáveis, em especial com as denúncias de propina na compra de vacinas em julho.



"Nossa série de avaliação de Bolsonaro em relação ao coronavírus mostra que a avaliação é bastante negativa e persistente, e ela perpassa inclusive pessoas que aprovam o governo e reprovam a condução da pandemia", diz Scalet. "Me parece que o cenário de que Bolsonaro vai capturar toda a melhora da economia em popularidade está fora de questão. Minha cabeça é de melhorar de onde está, mas sem chegar a esse 40% a 45%."

Para o cientista político e diretor do instituto Brasilis, Alberto Carlos Almeida, a inflação tem sido o determinante na deterioração da popularidade do presidente. Segundo Almeida, os eleitores, em especial de baixa renda, primeiro abandonam Bolsonaro por causa de uma redução do poder de compra. Em um segundo movimento, as denúncias de corrupção contra o governo podem consolidar uma posição contrária ao mandatário.

Almeida calcula que ainda há espaço para deterioração da aprovação de Bolsonaro. "Ainda tem uma estrada grande pela frente, mas, se a eleição fosse este ano, Bolsonaro teria um perfil eleitoral parecido com o do [ex-prefeito Marcelo] Crivella na eleição do Rio de Janeiro: ele tem voto suficiente para ir para o segundo turno, mas seria derrotado por qualquer um que fosse com ele. Ele está passando por um processo de crivellização", avalia.

Contato: cicero.cotrim@estadao.com
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