Economia & Mercados
04/09/2020 19:38

Especial: mercado faz caixa em e-commerce para comprar ações que serão 'salvas' pela vacina


Por Matheus Piovesana

São Paulo, 04/09/2020 - O mercado começa a ponderar, nos Estados Unidos e também no Brasil, que é hora de precificar o pós-pandemia nos ativos de renda variável. Isto significa voltar as atenções a aéreas, bancos e empresas que em resumo, dependem de movimento de pessoas nas ruas. Para comprar estes papéis, o investidor resolveu fazer caixa nas ações que mais lhe deram lucro em um ano que, até agora, é o pior para a economia mundial em décadas - as ações de tecnologia.

O símbolo deste movimento é a "redescoberta" do setor bancário, que ontem, evitou que o Ibovespa perdesse a casa dos 100 mil pontos mesmo com a forte baixa de posições como Vale ON. O Bank of America deu a senha para o movimento ao enviar a clientes relatório em que explicou que em seu portfólio de América Latina para setembro, zerou o caixa e a alocação em Iguatemi ON para elevar a presença em Bradesco, Itaú e Banco do Brasil. "Movemos o setor financeiro brasileiro a neutro porque o vemos suficientemente negligenciado."

Essa "negligência" se traduz em baixas de até 35% em 2020, caso da ação do Banco do Brasil. Dado o peso do setor bancário no Ibovespa, boa parte dos gestores concorda que a queda de quase 14% que o índice acumula no ano decorre do mau desempenho dos papéis, penalizados pela percepção de que um repique da inadimplência no final de 2020 e no início de 2021 é mais do que certo. Mas o mercado começa a se posicionar para o pós-crise.

"Esse movimento tem muito de gringo fazendo 'rotation'. Não tenho a menor dúvida de que isso vem de fundo quantitativo", comenta Alexandre Soares, operador da BGC Liquidez. Segundo ele, parte das posições montadas ontem no setor financeiro pode estar sendo desfeita hoje, o que explica a virada para o vermelho dos bancos. No entanto, o setor ainda tem uma semana de estável a positiva. No e-commerce, em comparação, a queda de 13% da B2W desde a última sexta indica que os papéis fecharão hoje valendo bem menos do que há sete dias.

"Até 10% de realização é normal. Parece que todo mundo 'acordou' e resolveu realizar seus lucros", afirma William Alves, estrategista-chefe da Avenue, corretora brasileira que atua no mercado americano. "O investidor sai das empresas tech, em que tinha que 'espremer' o valuation para achar 10% de potencial de alta, isso esperando um crescimento muito forte nos próximos anos, e vai para ações que ainda acumulam fortes perdas no ano."

A salvação

A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que a vacina contra a covid-19, vista como a salvação de empresas que dependem do contato social para vender produtos e serviços, só deve chegar à maior parte da população a partir de meados de 2021. Ao mesmo tempo, o governo dos Estados Unidos tenta avançar etapas para oferecer a imunização aos habitantes do país ainda em 2020. Na dúvida, os gestores fazem contas para descobrir quais papéis podem se valorizar mais quanto a covid for parte do passado.

Em relatório chamado "Ações para focar para quando tivermos uma vacina", sobre ações americanas, os analistas do Goldman Sachs separaram os papéis escolhidos em quatro grupos: 1) papéis que caíram muito em 2020, mas devem se recuperar com o 'retorno ao normal' das atividades; 2) papéis que parecem ter ganho vantagem de mercado com a quebra de rivais, mas que precisam da reabertura dos negócios para desfrutá-la; 3) papéis que devem se recuperar junto com a economia global; 4) papéis que devem ir bem no longo prazo, mas sobre os quais ainda há dúvidas de curto prazo.

A lista é ampla, e vai da empresa de cinemas IMAX e da Disney a administradoras de residências estudantis. Dois nomes, porém, chamam atenção: o da United Airlines, que viu desaparecer mais de 95% de sua receita no segundo trimestre, e a Boeing, em que a crise provocada pela pandemia no setor se somou à do 737-Max. Para a primeira, o banco estabelece um potencial de alta de 62,6% para as ações. Para a segunda, enxerga até 28,7% de valorização em um ano.

Embora o Goldman trate de papéis negociados em Nova York, um sentimento parecido começa a surgir na B3. Ontem, em meio ao sell-off do e-commerce, Azul e Gol fecharam o pregão entre as maiores altas do índice. A recuperação gradual da demanda tem ajudado, mas os fundamentos imediatos não explicam a alta. "É a rotatividade de setores o que está movendo os papéis. A situação das aéreas não tem nada resolvido. É preço, não é fundamento", resumiu Victor Hasegawa, gestor de ações da Infinity Asset.

Contato: matheus.piovesana@estadao.com
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