Economia & Mercados
27/04/2020 14:11

Com covid e petróleo, IPCA em 2020 pode ser menor do Plano Real, mas dólar é entrave


Por Thaís Barcellos e Cícero Cotrim

São Paulo, 27/04/2020 - Com o choque desencadeado pelo coronavírus na economia brasileira e o derretimento dos preços de petróleo no mercado internacional, as projeções para a inflação oficial este ano estão se aproximando da menor taxa do Plano Real, de 1,65%, em 1998. Segundo economistas consultados pelo Broadcast, há chance de nova mínima história em 2020, mas o aumento ininterrupto do dólar, que chegou a ultrapassar R$ 5,70 na última sexta-feira (24) em meio ao caos político no País, pode ser um entrave.

Na última pesquisa Focus, a mediana para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2020 caiu de 2,52% para 2,23%, já abaixo do piso da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (2,5%). Se confirmada essa expectativa, o presidente do Banco Central terá de escrever uma carta ao ministro da Economia explicando porque não atingiu o objetivo, o que, conforme analistas, deve ser tarefa fácil diante do impacto extraordinário do coronavírus.

Mas a condução da taxa básica de juros está permeada por incertezas. Nesta semana, ganhou força a expectativa de corte maior que 0,50 ponto porcentual da Selic no Comitê de Política Monetária (Copom) de maio, depois que o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, destacou que agora o cenário estava mais claro, com redução das expectativas de atividade e inflação em meio à pandemia. Contudo, com a escalada da crise política, acompanhada da mesma magnitude pelo dólar, já há dúvidas.

Com expectativa para o IPCA de 2020 de alta de 1,10%, o economista-chefe da Garde Asset, Daniel Weeks, avalia que, se mantida a tensão no ambiente político e nos mercados, "tira a aceleração da magnitude do corte" da mesa. "Nesse caso, fica mais provável o corte de 0,50 ponto do que de 1 ponto."

O economista Ederson Schumanski, da Sicredi Asset, projeta 1,66% para o IPCA de 2020, considerando que o hiato do produto, que deve se ampliar rapidamente com a crise do coronavírus, tende a mais que compensar a significativa depreciação cambial.

"Uma curva de Phillips normal indicaria, com o hiato do produto perto de 10%, uma inflação perto de 1%. Mas não funciona exatamente assim na realidade. Como o Brasil tem preços monitorados e outras peculiaridades, com a maior recessão da história, ainda vamos ter uma inflação mais perto de 2,0%", avalia.

Schumanski já considera um retorno do barril do petróleo, no contrato Brent, para cerca de US$ 35. Mesmo assim, a gasolina deve cair 5% no ano e o etanol, 12%. O economista também com pressão forte de energia elétrica no segundo semestre, com o adiamento de reajustes anuais de distribuidoras. Por outro lado, o economista avalia que carnes devem começar a deflacionar no curto prazo, com a redução da demanda interna e também da China. Sobre a Selic, Schumanski segue com expectativa de queda de 0,75 ponto em maio, mas admite que o aumento das incertezas com a crise política diminui a probabilidade desse corte mais agressivo.

O economista Leonardo França Costa, do ASA Bank, também não descarta que a inflação atinja a taxa mais baixa do Plano Real neste ano, mas recentemente elevou a projeção de 1,70% para 1,90% em função da desvalorização cambial. Há uma semana, o ASA Bank passou a estimar que o dólar deve terminar o ano em R$ 5,30. Mas, se o câmbio seguir no patamar atual, França Costa admite que a pode elevar um pouco a projeção. A estimativa atual já leva em consideração um retorno do barril de petróleo a US$ 35, assim como a perspectiva de que os alimentos sigam uma tendência de acordo com a sazonalidade.

O economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, diz que deve revisar para baixo sua projeção de 2,40% para o IPCA em 2020 assim que forem divulgados os dados de abril. Ele estima deflação de 0,12% no mês e considera que o dado seria compatível com um IPCA mais próximo de 2,0% neste ano.

"A única coisa que tem impedindo a inflação de cruzar esse nível de 2,0% é a taxa de câmbio, que, mesmo assim, deve pegar muito pouco nos manufaturados. Um impacto mais forte, que jogue o IPCA para cima, só vai acontecer se tivermos uma guinada súbita nos preços do petróleo", diz o economista.

Para Agostini, os efeitos do dólar mais caro devem ser mais sentidos em produtos agrícolas, devido à cotação no mercado internacional, mas é provável que haja pouco repasse para carnes e produtos manufaturados. O fechamento dos mercados da Europa e a queda da demanda interna devem manter os preços mais baixos no mercado doméstico, avalia.

"Esse nosso cenário de inflação leva em conta, também, que vai ter uma reabertura e recuperação da economia a partir do segundo semestre, o consumo volta a subir e os preços do barril de petróleo chegam a algo entre US$ 30 e US$ 35 lá para julho. Se isso não acontecer, pode mudar", explica Agostini.

Contato: thais.barcellos@estadao.com; cicero.cotrim@estadao.com
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