Economia & Mercados
07/06/2021 08:37

Interrupção em Mariana cria fissura em retomada da produção e imagem da Vale


Por Matheus Piovesana, Denise Luna e Beth Moreira

São Paulo e Rio, 04/06/2021 - A Vale anunciou nesta sexta-feira, 4, que vai paralisar as operações no Complexo de Mariana (MG), como consequência da interdição das atividades em áreas próximas à barragem Xingu, da mina Alegria. Embora analistas considerem que o impacto sobre a produção, de 40,5 mil toneladas de finos de minério de ferro ao dia, seja pequeno, a leitura é que a parada no complexo pode atrapalhar a retomada da produção da mineradora e a imagem que tenta vender de ter superado as tragédias do rompimento das barragens em Mariana (de sua controlada Samarco) e Brumadinho (MG), no qual morreram mais de 300 pessoas.

As atividades ficarão suspensas porque a interdição impede a circulação de trens no Ramal Fábrica Nova, da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM), e o escoamento da produção da Usina Timbopeba. Além disso, acessos internos da mina Alegria também foram interditados. A companhia teve de paralisar as atividades após uma notificação da Superintendência Regional do Trabalho, que não teve os motivos revelados. Em comunicado, afirma que está tomando as medidas necessárias para retomar os trabalhos "o mais breve possível".

O mercado financeiro não reagiu bem à notícia, e há pouco, a ação da Vale caía 1,81% na Bolsa de São Paulo. Além da incerteza sobre o período de paralisação, a notícia mostra que a mineradora ainda enfrenta desafios para restabelecer completamente a produção de minério de ferro.

Analistas estimam que, desde a tragédia de Brumadinho, em 2019, a Vale tem 100 milhões de toneladas em capacidade anual total ou parcialmente paralisadas, por conta de instabilidade de barragens de rejeitos.

Desde o ano passado, a empresa tem afirmado estar pronta para retomar a produção. Essa é a principal aposta para que, até o fim do ano que vem, a companhia possa produzir 400 milhões de toneladas de minério ao ano. Em 2020, foram 300 milhões de toneladas.

Essa projeção, no entanto, pode ser prejudicada se a paralisação em Mariana se estender. "Eu não vejo grandes problemas pensando no curto prazo, mas dependendo do tempo que durar essa redução, pode impactar a produção futura", avaliou Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos.

Semanas atrás, em evento para o mercado, a Vale disse que sua capacidade produtiva estava em 327 milhões de toneladas ao ano, e a meta é produzir de 315 milhões a 335 milhões de toneladas de minério, em 2021. Os analistas Leonardo Correa e Caio Greiner, do BTG Pactual, afirmaram, em relatório, que embora a mineradora esteja apta a cumprir o piso da meta, dificuldades como as de Mariana têm aumentado. "Nossa estimativa de 320 milhões de toneladas (neste ano) parece, de alguma forma, otimista", afirmam.

A Vale não informou qual porcentagem de sua produção diária vem do Complexo de Mariana, e de que formas tentará reverter a notificação da SRT que paralisou o complexo. A SRT também não deu maiores informações.

Instáveis

A Vale não é a única a ter a segurança de suas barragens questionada em Minas Gerais. Ontem, a Justiça mineira concedeu liminar em favor do governo do Estado que obriga a CSN a tomar medidas para evitar a ruptura da barragem da mina de Fernandinho, em Rio Acima, a 39 quilômetros de Belo Horizonte.

Assim como a estrutura da Vale, a barragem da CSN está no nível 2 do Plano de Ação de Emergência de Barragens (PAEB). A empresa informou que o trabalho de descomissionamento da estrutura deve ser concluído até março. Não houve paralisação de operações.

Roberto Galery, chefe do Departamento de Engenharia de Minas (Demin) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), afirma que o nível 2 indica que a instabilidade de uma barragem já oferece perigo de ruptura. "Temos vários níveis. O 1 é de atenção. O nível 2 significa que é preciso tomar uma providência urgente", diz.

Em seu site, a Vale diz que, no nível 2, as sirenes de emergência soam nas regiões que seriam afetadas pelo colapso de uma barragem, a chamada zona de autossalvamento, que é esvaziada. Em Mariana, de acordo com a empresa, essa operação aconteceu em setembro.

Pouco impacto financeiro

Ainda que a paralisação em Mariana se estenda por alguns meses, analistas acreditam que o impacto sobre os resultados financeiros da Vale será pequeno. "33 mil toneladas por dia (produção de Timbopeba) significa que se a produção ficar parada por três meses, o impacto em volume vai ser de cerca de 1% do guidance de produção para 2021. Não parece significativo", diz Daniel Sasson, chefe de análise de commodities do Itaú BBA.

Galery, da UFMG, diz que o minério produzido pela Vale em Minas tem menor concentração de ferro, perto de 50%, o que significa que é menos puro do que o extraído no Pará, por exemplo. Por outro lado, ao reduzir a oferta no mercado internacional, a Vale daria suporte a novas altas do minério de ferro, que no último mês subiu 8% e bateu recordes de cotação.

"Mantemos recomendação de compra (para a ação da Vale) e ressaltamos que o aumento nos preços do minério de ferro deve mais que compensar este pequeno impacto (se houver)", escreveram Correa e Greiner, do BTG.

Contato: matheus.piovesana@estadao.com, denise.luna@estadao.com e beth.moreira@estadao.com
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