Economia & Mercados
26/07/2021 09:41

Especial: Preço da ação do TC deve ser conhecido hoje, com riscos e pouca clareza em números


Por Cristiane Barbieri e Matheus Piovesana

São Paulo, 26/07/2021 - Nesta segunda-feira, deve ser conhecido o preço das ações na oferta inicial (IPO, na sigla em inglês) do TC, o antigo TradersClub, plataforma que junta ferramentas, fóruns, notícias e cursos, voltados principalmente a investidores pessoa física. O início das negociações dos papéis na Bolsa está previsto para quarta, 28.

Pelo prospecto da oferta, documento pelo qual a empresa se apresenta aos investidores, o TC espera captar cerca de R$ 760 milhões (ou R$ 710 milhões, descontados os custos da emissão), caso todos os lotes sejam vendidos e a ação saia no preço médio da faixa indicativa, de R$ 10,13. A plataforma está sendo avaliada entre R$ 2,6 bilhões antes da oferta (pré-money, no jargão do mercado) e R$ 3,3 bilhões, após o ingresso dos recursos do IPO. Segundo fontes, a demanda de interessados já teria superado R$ 800 milhões.

Apesar da emissão ter certa simbologia, por marcar a relevância que o investidor pessoa física tem ganhado com as aplicações em renda variável e o recorde de empresas brasileiras buscando recursos via Bolsa de Valores, o IPO do TC tem também alguns indicativos que mostrariam maior necessidade de transparência. De um lado, há números não revelados, como a decisão de não fornecer projeções (guidance) de crescimento da empresa, ao mesmo tempo em que não se detalha a base de clientes - o que torna difícil para o investidor entender se o negócio é sustentável. De outro, há estimativas que poderiam ser vistas como superestimadas. Uma das premissas consideradas para calcular o valor do TC, numa emissão de títulos de dívida (debêntures) em abril, por exemplo, indica o uso de múltiplos equivalentes aos da XP.

Além disso, a oferta também mostra um negócio incipiente, de acordo com especialistas que olharam o prospecto. O IPO está sendo conduzido por apenas dois bancos: o BTG Pactual (líder) e o Modalmais. Ambos são fornecedores de conteúdo para TC, por meio da Exame Invest Pro (que pertence ao BTG) e da Eleven (do Modalmais). Bancos de investimento que participaram de vários IPOs em anos recentes disseram não ter entrado na operação do TC porque a consideram muito pequena.

A receita líquida do TC foi de R$ 40 milhões no ano passado, com lucro de R$ 13 milhões. Até abril deste ano, a receita líquida foi de R$ 21 milhões, mas a empresa teve prejuízo. Pequeno, de R$ 26 mil, mas que indica o custo de fortalecimento da marca. A geração de caixa medida pelo Ebitda (lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização) de R$ 2,2 milhões do primeiro quadrimestre de 2020 foi para R$ 663 mil no mesmo período deste ano. Com a perspectiva do IPO, o TC foi às compras e investiu em contratações e propaganda, com anúncios veiculados em canais de TV por assinatura.

Com a maior exposição e a aquisição em abril da Sencon, uma empresa que calcula e emite guias de pagamentos de imposto de renda de investidores, a base de clientes cresceu. Até março, a plataforma tinha 294 mil inscritos. Em abril, eram 473 mil usuários registrados. Do total, 182 mil acessavam o aplicativo do TC ao menos uma vez por semana, sendo que os usuários da Sencon contabilizados eram os que tinham entrado pelo menos uma vez no ano. A empresa tem 75 mil pagantes, e o tíquete médio é de R$ 283 (nesse valor saem da conta a quantia paga pelos clientes da empresa recém-adquirida, que cobra menos pelos serviços). Há 150 pessoas que pagam pelo pacote mais caro, o TC Private, com custo próximo a R$ 8 mil ao mês.

Ferramentas tecnológicas, serviços caros de serem bem produzidos e um mercado com poucas barreiras a entrada de concorrentes tornam difícil projetar as expectativas para o TC. Para se ter uma ideia desses números, porém, é possível usar os dados divulgados na operação de financiamento para a compra da Sencon. O TC emitiu R$ 72,8 milhões em debêntures conversíveis em abril, e considerou algumas premissas para estimar seu valor de mercado. Uma delas é a de que terá lucro líquido de R$ 48 milhões neste ano, e de R$ 102 milhões no próximo. Para a receita líquida, as estimativas são de R$ 143 milhões em 2021, e de R$ 260 milhões em 2022. Bem acima dos números divulgados até abril, último dado disponível.

O TC também levou em conta múltiplos obtidos por grupo de empresas comparáveis, entre as premissas. Para o preço da ação em relação ao lucro, o número este ano é de 41,4 vezes; no próximo, estaria em 37 vezes. O TC não revela quais as empresas consideradas no prospecto, mas a título de comparação, o preço/lucro da plataforma de investimentos XP na Nasdaq está próximo a 37 vezes. A XP teve receita líquida de R$ 8,1 bilhões e lucrou R$ 2,3 bilhões, em 2020.

A plataforma também não detalha qual a estratégia para fazer a receita crescer 3,5 vezes em relação ao ano passado, mas informou que, do dinheiro a ser eventualmente captado no IPO, 60% (pouco mais de R$ 400 milhões) irão para aquisições, 20% para o aprimoramento da plataforma e outros 20% serão gastos em marketing.

O projeto, porém, tem grande ambição. "Não estamos falando mais de 3,5 milhões de investidores em renda variável (número de CPFs registrados na B3), mas sim de 86 milhões de pessoas que possuem uma conta no banco e que podem e deveriam investir em educação financeira", escreve Pedro Albuquerque Filho, um dos fundadores e CEO do TC, nos documentos da oferta. Procurado, o TC não comentou, por estar em período de silêncio.

Contato: cristiane.barbieri@estadao.com; matheus.piovesana@estadao.com
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