Agronegócios
18/08/2020 10:37

Especial milho: preços devem seguir sustentados com retomada da economia e dólar em alta


Por Clarice Couto

São Paulo, 18/08/2020 - Os preços do milho devem seguir sustentados nos próximos meses. Mesmo com a colheita da segunda safra avançada, a oferta do cereal não tem aumentado no mercado de lotes, e as cotações sobem há várias semanas. "No pico da colheita, em julho, a média dos preços em Mato Grosso (maior produtor nacional) ficou entre R$ 30 e R$ 33/saca, contra R$ 20 a R$ 23 no mesmo período do ano passado", diz o superintendente do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), Daniel Latorraca. Segundo ele, esse patamar deve se manter pelo menos até outubro, quando a safra dos Estados Unidos estará definida e os preços dos futuros na Bolsa de Chicago se ajustarem.

Segundo o corretor Leon D'avalo, da Granos, de Campo Grande (MS), produtores do Estado apostam em preços mais altos. "Eles não se interessam por fazer negócio a R$ 48/saca, nem a R$ 50/saca. Querem esperar", contou. Até a última sexta-feira, as propostas de compra no Estado chegavam a R$ 46/saca, ante R$ 40 no fim de julho.

A sustentação das cotações nas diversas praças vem, em boa medida, da ampla comercialização antecipada da segunda safra. Em Mato Grosso, até maio, de acordo com Latorraca, 80% da produção estimada para o Estado, de 33,272 milhões de toneladas, já tinha sido vendida. "Dois fios condutores levaram a isso: a escassez de milho no mercado interno desde o fim do ano passado, com forte exportação, e a demanda externa aquecida também este ano. Além disso, o câmbio é favorável." A moeda norte-americana acumula alta de cerca de 5% em agosto e de 36% em 2020.

As melhores condições da BR-163, que reduzem o custo de transporte até o terminal fluvial de Miritituba (PR), são outro fator de estímulo às vendas para o exterior, na avaliação de Latorraca. Miritituba recebe parte da produção mato-grossense destinada à exportação, que segue em barcaças até portos da região.

A necessidade das usinas de etanol, que no Centro-Oeste têm o milho como matéria-prima, é mais um elemento de sustentação do mercado. "Elas devem fazer novas compras nos próximos meses", diz Latorraca. Ele lembra que os Estados que mais consomem o etanol mato-grossense, São Paulo e os da região Norte, começam a deixar para trás a pior fase da quarentena e ensaiam um retorno gradual das atividades econômicas.

A colheita em Mato Grosso do Sul, Estado que disputa com Goiás a terceira posição nacional de produção de milho, está atrasada em relação à do ano passado: até o dia 6 de agosto, alcançava 31% da área plantada, contra 88% há um ano, conforme a consultoria AgRural. Conforme D'avalo, algumas empresas chegaram a propor um "pacotão" de negócios, com embarques previstos para setembro, outubro e dezembro, mas a ideia não despertou interesse dos produtores. "Ele está capitalizado, sem contas para pagar, por que venderia agora?", questionou.

Em Goiás, o consultor Ênio Fernandes, da Terra Agronegócios, avalia que esse controle da oferta pelo produtores fragiliza em especial as indústrias locais. "Quem está mais apertado (com menos estoque) é o mercado interno, menos posicionado (adquiriu menor volume de milho de forma antecipada). Ao mesmo tempo o mercado de proteína animal está aquecido e os embarques para o exterior continuam fortes", ponderou. Em Goiás a retirada do cereal do campo equivale a 70% das lavouras, segundo a AgRural.

"O que falta da safra de milho de Mato Grosso para ser comercializado, cerca de 10%, será disputado por todo mundo: consumidores domésticos (de alimentos), indústria de etanol e exportadores", afirmou Latorraca.

No Paraná, segundo maior produtor, a colheita da segunda safra atinge 51% da área, enquanto a comercialização antecipada abrange 42% da produção esperada. É o número de negociação mais alto para esta época do ano da série histórica do Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria de Agricultura. Em julho de 2019, 35% da produção paranaense tinha sido vendida. Nos dois anos anteriores, esse porcentual foi de 19%.

O analista de milho do Deral, Edmar Wardensk Gervasio, diz que nada garante que o volume de safra ainda por vender estará disponível ao mercado - boa parte já está comprometida para cooperativas do Estado. "Quem tem contrato com cooperativa não necessariamente travou o preço", explica sobre a expectativa dos agricultores de boas oportunidades. Além disso, o Paraná colherá 1,6 milhão de toneladas a menos do que o previsto inicialmente, diz ele - a produção em segunda safra está estimada em 11,4 milhões de toneladas. Em tese, restariam 6,6 milhões de toneladas por vender.

"Será muito difícil haver uma pressão sobre os preços só por causa desse volume. Podemos até ver oscilações para baixo, mas pontuais e não significativas", disse Gervasio, lembrando do cenário de retomada econômica no País. "No segundo semestre, tradicionalmente há maior consumo de milho porque um número maior de suínos e aves está em processo de engorda, de olho nas festividades do fim do ano. Esse ano está atípico mas, mesmo assim, provavelmente veremos uma retomada do consumo, com uma possível migração da demanda por carne bovina para carne suína e de aves, cuja base alimentar é milho." Gervásio considera, além disso, a perspectiva de aumento das exportações de carne suína no segundo semestre, citando que alguns frigoríficos estão sendo abertos para atender à aquecida demanda externa.

Há outro detalhe relevante, aponta ele: a profissionalização da produção de milho segunda safra no Paraná nos últimos cinco anos. "Hoje o produtor investe mais em tecnologia e tratos culturais para aumentar a rentabilidade obtida com a cultura. Isso também se reflete na comercialização, pois ele quer canais que paguem melhor", explica. "Quem puder vai adiar um pouco mais os negócios."

Contato: clarice.couto@estadao.com
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