Agronegócios
05/01/2022 16:06

Especial/Soja: Brasil leva vantagem na exportação neste início de ano, com oferta, câmbio e qualidade


Por Clarice Couto

São Paulo, 05/01/2022 - Um conjunto de fatores coloca a soja brasileira em vantagem no mercado internacional em relação à norte-americana neste início de 2022: dólar valorizado ante o real, maior teor de proteína, frete marítimo mais barato que nos Estados Unidos e, principalmente, a previsão de uma colheita antecipada no Brasil. Segundo consultores e analistas do mercado ouvidos pelo Broadcast Agro, os problemas climáticos que vêm sendo observados na América do Sul não são desconsiderados mas também não alteraram, pelo menos até o momento, a situação de maior competitividade da soja nacional.

"Desde o início de agosto (de 2021), quando se criou a expectativa de um plantio antecipado no Brasil, todo mundo previu que o calendário de soja seria antecipado em comparação a 2020. O importador chinês se preparou para desacelerar a aquisição do grão futuro e comprar da mão para boca no mercado disponível a soja de 2021/22", disse o diretor da Pátria Agronegócios, Matheus Gomes Pereira. "Os chineses estão contando que terá mais oferta de soja em janeiro. Muitos navios estão a caminho do Brasil para embarcar em janeiro, fevereiro", corroborou o consultor Vlamir Brandalizze, da Brandalizze Consulting.

Produtores norte-americanos costumam exportam mais soja de outubro a dezembro e, em menor proporção, em janeiro, tendo em vista que a maior parte da safra brasileira começa a chegar ao mercado, de fato, a partir de fevereiro. Em 2022, entretanto, a perspectiva no fim do ano era de que o volume do grão a ser colhido em janeiro no Brasil seria considerável, conforme a Agroconsult. Em evento de fim de ano da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), o presidente da consultoria, André Pessôa, apresentou estimativa de que na primeira quinzena de janeiro seriam colhidas 6,5 milhões de t da oleaginosa, muito acima das 700 mil t colhidas em igual período de 2021. Do total, esperava-se que 68% viria de Mato Grosso. Contudo, os trabalhos ainda não começaram em virtude de chuvas em regiões produtoras do Estado.

Para a segunda quinzena de janeiro, a Agroconsult previu 18 milhões de t de soja colhidos, acima dos 6,4 milhões de t retirados na segunda quinzena de 2020 e também dos 14,2 milhões de t da safra 2018/19. Para a primeira quinzena de fevereiro, a perspectiva era de colheita de 26,8 milhões de t de soja, ante 17 milhões em igual mês de 2021 e 25 milhões em janeiro de 2019.

As atualizações sobre as condições climáticas na América do Sul, por enquanto, não mexeram com os prêmios pagos pela soja brasileira, de acordo com o analista de mercado da IHS Markit, Aedson Pereira. Segundo ele, as recentes e sucessivas altas dos futuros da soja em na Bolsa de Chicago (CBOT) e o receio de perdas no campo têm deixado vendedores retraídos, reduzindo a liquidez e levando compradores a não mexer nos prêmios. Contudo, ele considera a possibilidade de a China recorrer à soja norte-americana no curto prazo, a depender de quando a soja brasileira começar a ser colhida.

Se a oferta de soja brasileira se confirmar volumosa, a tendência é de os prêmios pagos por tradings sobre a cotação da oleaginosa diminuírem no Brasil, tornando o grão nacional mais atrativo para importadores, em especial os chineses. Segundo Pereira, da Pátria Agronegócios, no fim da última segunda-feira (3), o prêmio pago pela soja brasileira no porto de Paranaguá era de US$ 0,79 por bushel, enquanto o ofertado pela soja norte-americana no Golfo dos Estados Unidos era de US$ 1,04 por bushel.

Para fevereiro e os meses seguintes, a perspectiva era de prêmios ainda mais baixos. Segundo o coordenador de Grãos da Datagro, Flávio Roberto de França Júnior, a previsão, em dezembro, era de prêmio ao redor de US$ 0,48 por bushel para a soja a ser embarcada em fevereiro e US$ 0,34 para março. Já para o grão norte-americano, Brandalizze disse que os prêmios deveriam ficar entre US$ 0,50 e US$ 0,70 por bushel de fevereiro em diante. "Na safra passada não estávamos competitivos em dezembro, janeiro, fevereiro, porque a soja só começou a ser colhida em fevereiro", lembrou França Júnior.

Pereira, da Pátria Agronegócios, recordou que as exportações de soja norte-americana para a China ainda sofrem taxação de 25%, mas pontuou que, mesmo desconsiderando na conta esse porcentual, o grão brasileiro está mais competitivo. "Hoje, a soja brasileira é mais barata que a dos Estados Unidos", disse, acrescentando que os preços do grão nacional no fim do ano eram superiores aos do norte-americano. Conforme cálculos feitos pelo consultor, tomando por base apenas a cotação na Bolsa de Chicago (CBOT) no dia 3 de janeiro, prêmios e frete, o preço da soja disponível no Golfo dos EUA naquela data era de US$ 534 por tonelada, enquanto no porto de Paranaguá (PR) era de US$ 519 por tonelada.

Um fator apontado por todos os especialistas como determinante para a competitividade da soja brasileira no mercado externo desde o fim do ano passado é o câmbio. Isso porque quanto mais valorizado o dólar em relação ao real, menor tende a ser o valor pago em dólar, por tradings, pelo grão nacional, na conversão do valor da saca em reais para dólar. Pereira destaca que a alta da divisa norte-americana também abre espaço para que tradings estimulem a oferta de soja e/ou a demanda, conforme o apetite de cada ponta no momento. "O exportador dilui a alta, paga um pouco a mais para o produtor, cobra um pouco menos do comprador chinês, dependendo do lado que precisa ser estimulado", diz.

A especialista em Inteligência de Mercado em Grãos e Oleaginosas da consultoria StoneX, Ana Luiza Lodi, avalia que a tendência é de compradores chineses virem buscar soja brasileira aproveitando o câmbio e também o maior teor de proteína. "Havendo oferta da soja brasileira e dos Estados Unidos, com preços competitivos, o teor de proteína pode ser relevante (na decisão do comprador)", destaca. Enquanto o grão brasileiro tem teor de proteína variando de 44% a 48%, o norte-americano conta com 42% a 44%, segundo Brandalizze. "Quando uma empresa chinesa faz uma ração com soja brasileira, usa menos volume do grão do que se fosse utilizar o dos Estados Unidos. Dependendo do animal para o qual se destina a ração, é preciso ter um nível determinado de proteína, então a nossa (soja) acaba sendo mais competitiva", argumentou o consultor.

Até mesmo o frete marítimo em patamares elevados desde o ano passado, em decorrência de políticas de restrição de circulação em diversos países acompanhadas de retomada da atividade econômica, pode acabar favorecendo a soja brasileira. França Júnior, da Datagro, considera que os níveis de preços do transporte marítimo tendem a se manter altos neste ano em todo o mundo, mas lembra que frete mais caro "tende a derrubar o valor do prêmio" pago pela soja. "Isso seria um fator inibidor para os preços da soja durante a nossa colheita; já aconteceu em 2021 e pode acontecer em 2022. Prêmios mais baixos não são bons para o produtor, mas deixam o nosso produto ainda mais competitivo", ponderou. Ele lembra, em contrapartida, que no início do ano o frete marítimo dos Estados Unidos para a China costuma ser mais caro, porque diminui o fluxo de navios para a costa norte-americana e aumenta para a América do Sul.

Brandalizze considera, ainda, que o fato de tradings chinesas, como a Cofco, terem operações no Brasil também facilita as exportações brasileiras do grão para a China. "É de interesse da empresa que está aqui vender mais. No mercado norte-americano elas não têm o mesmo peso que aqui; lá, dominam as tradings americanas", argumentou.

Contato: clarice.couto@estadao.com
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