Selecione abaixo qual plataforma deseja acessar.

Pressão regulada

Fraude no Master parecia restrita a planilhas, até o Banco Central decretar a liquidação do banco

30 de dezembro de 2025

Por Márcio Rodrigues

A fraude de R$ 12 bilhões no Banco Master parecia restrita a planilhas de auditoria, até o dia em que o Banco Central decretou a liquidação e, sem querer, expôs o grau de interferência que ronda qualquer regulador no País. Em poucas semanas, a autarquia passou de árbitro a alvo.

No Supremo, o ministro Dias Toffoli marcou, em pleno recesso, uma acareação entre o diretor de Fiscalização do BC, Ailton de Aquino, e os investigados Daniel Vorcaro e Paulo Henrique Costa. A Procuradoria-Geral da República chamou o ato de prematuro; o BC ingressou com embargos, perguntando quais pontos seriam confrontados, por que a urgência e em que condição seu diretor seria ouvido.

Nada feito: o cronograma foi mantido, embora Toffoli tenha delegado à Polícia Federal a palavra final sobre reunir ou não os depoentes frente a frente. Mesmo qualificado como “terceiro interessado”, o fiscalizador virou personagem da investigação.

No Tribunal de Contas da União, o ministro Jhonatan de Jesus falou em “precipitação” do BC na liquidação da instituição financeira e exigiu explicações em 72 horas. O BC respondeu sob sigilo, tentando evitar que o rito prudencial fosse redesenhado a posteriori.

Os reflexos apareceram na Bolsa: analistas citaram “ruído” institucional, freando o Ibovespa apesar do cenário externo favorável. Para conter danos, diversas associações, incluindo Febraban, Anbima, ABBC, Zetta e até o sindicato dos servidores divulgaram notas reafirmando a autonomia do BC – algo que, em tese, não precisaria de defesa.

Para se ter uma ideia do tamanho do “ruído”, todo esse processo colocou, lado a lado, Febraban e Zetta, que até recentemente trocavam acusações em torno de concorrência no setor financeiro e questões tributárias.

O roteiro se adensou quando vieram à tona seis ligações do ministro Alexandre de Moraes ao presidente do BC, Gabriel Galípolo, no auge da crise. O vínculo de R$ 129 milhões entre o escritório da esposa de Moraes e o Master alimentou novos pedidos de investigação na PGR e no CNJ. O procurador-geral, Paulo Gonet, arquivou a primeira representação; outras seguem na fila.

Em 30 de dezembro, a PF colheu os depoimentos dos três protagonistas em sala reservada do Supremo. Caso surgissem contradições, haveria acareação. O simples fato de essa hipótese pairar sobre um diretor do BC é sintomático: o perímetro regulatório tornou-se campo de batalha política, jurídica e corporativa.

Tudo indica que o TCU não terá votos para reverter a liquidação, mas a mensagem permanece: decisões técnicas podem ser submetidas ao crivo da conveniência. Claro que o BC pode errar e cabe a alguém apontar isso. No entanto, toda vez que o regulador precisa justificar o óbvio – intervir num banco insolvente, que corria atrás de liquidez e tentava, a todo custo, ganhar tempo – na verdade perde-se tempo, e o sistema, confiança.

Veja também