A mudança no tempo verbal seria uma dica do presidente do Banco Central?
9 de maio de 2025
Por Cícero Cotrim e Célia Froufe
O Comitê de Política Monetária (Copom) sinalizou que o ciclo de aperto monetário, que estava no “gerúndio” até esta decisão, passou para o pretérito perfeito – o recurso que indica que uma ação está no passado e já foi concluída. No comunicado desta quarta-feira, o colegiado deixou todas as opções em aberto para o próximo encontro, pregando a necessidade de “cautela adicional e flexibilidade”, diante da escalada da incerteza. Além disso, abandonou a “assimetria altista” no seu balanço de riscos pela primeira vez desde setembro do ano passado, quando havia voltado a aumentar a Selic.
O tempo verbal foi uma dica dada (sem querer?) pelo presidente do BC, Gabriel Galípolo: “Estamos aqui tateando para entender se o nível que a gente está caminhando – importante o gerúndio aqui -, se o nível que nós estamos caminhando está chegando no patamar contracionista o suficiente para a convergência da inflação”, afirmou, em um evento do J. Safra, em 28 de abril. No dia seguinte, ele confirmou ao Broadcast em coletiva de imprensa que o guidance do Copom de março para este mês continuava valendo: “Está valendo tudo o que está colocado na comunicação anterior, esse é o nosso entendimento.”
A combinação da “cautela adicional e flexibilidade” e da “assimetria altista” já vinha sendo apontada por economistas do mercado como um sinal que aumenta a probabilidade de manutenção da taxa Selic no nível atual, de 14,75% ao ano, na próxima reunião do comitê, em junho. Faz sentido, já que: i) as projeções do BC para a inflação de 2026, horizonte relevante da política monetária, já está mais próxima do centro do que do teto da meta; e ii) os riscos em torno das estimativas estão equilibrados.
Há também outras sinalizações. No quinto parágrafo do comunicado, o Copom afirma que o cenário atual prescreve “uma política monetária em patamar significativamente contracionista por período prolongado para assegurar a convergência da inflação à meta”. Não se sabe qual nível de juros o comitê considera “significativamente contracionista”, mas trata-se de um distanciamento em relação aos comunicados anteriores, nos quais o colegiado pregava a necessidade de uma Selic “mais contracionista”.
Aliás, o comitê também abandonou nesta quarta-feira a afirmação de que o cenário é “adverso” para a convergência da inflação, que estava presente no comunicado de março. Além disso, sinalizou que gostaria de analisar os efeitos do aperto monetário conduzido até aqui na inflação, quando mencionou “o estágio avançado do ciclo de ajuste e seus impactos acumulados ainda por serem observados” como uma das razões para não fornecer uma sinalização para junho.
O grupo fez questão de se precaver indicando uma série de senões que podem surgir até a reunião de junho. Além de não se adiantar a uma decisão agora, em meio a tantas incertezas internas e principalmente externas, o Copom terá à sua disposição todas as ferramentas que julgar necessárias para usar em seu próximo veredicto.
O colegiado citou que o cenário internacional – em especial vindas da taxação dos EUA – é o principal ponto de interrogação e que a inflação dos países tende a reagir de forma heterogênea mundo afora. Internamente, apontou que as estimativas do mercado seguem desancoradas, mas apresentou projeções menores para a inflação de 2025 (4,8%) e de 2026 (3,6%), que se tornou o horizonte relevante da política monetária agora.
Apesar de o balanço de riscos ter se tornado simétrico, não foram alterados os fatores de pressão para cima nos preços. E o rumo do fiscal segue sendo um desafio constante localmente.
No Focus desta segunda-feira, 5, a mediana para a taxa Selic no fim de 2025 passou de 15% para 14,75% – em um cenário que considera mais uma alta residual, de 0,25 ponto, em junho, e um corte de mesma magnitude em dezembro. É preciso ver se o mercado – salvo uma correção nos rumos da comunicação na ata da próxima terça-feira, 13 – também vai passar do gerúndio para o pretérito perfeito, mudando expectativas para juros estáveis em 14,75% ao longo de todo este ano.
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