13 de outubro de 2025
Por Aline Bronzati, correspondente
O Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial reúnem, nesta semana, a nata de banqueiros centrais e ministros das Finanças sob o alerta de que a resiliência global ainda pode ser testada, enquanto os Estados Unidos mantêm o shutdown. Do Brasil, a comitiva irá desfalcada: o ministro das Finanças, Fernando Haddad, cancelou novamente a participação, alegando que permanecerá no País para o “cumprimento de agendas oficiais”, após a derrota do governo com a derrubada da Medida Provisória (MP) alternativa à alta do IOF.
“A incerteza disparou e continua a subir. Apertem os cintos: a incerteza é o novo normal e veio para ficar”, alertou a diretora-geral do FMI, Kristalina Georgieva, em discurso que serve de abre-alas para as reuniões anuais do Fundo, na próxima semana.
Os encontros anuais do FMI de 2025 devem ser palco de debates sobre os impactos econômicos das transformações geopolíticas e tecnológicas, em meio a turbulências nas políticas, do comércio à imigração. As reuniões anuais do Fundo serão realizadas na próxima semana, em Washington, nos EUA, entre os dias 13 e 18 de outubro.
A delegação brasileira deve ser chefiada pelo presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo. Essa não é a primeira vez que Haddad deixa de ir a eventos internacionais. Nas reuniões de Primavera do FMI, em abril último, ele também não compareceu por conta da necessidade de tocar pautas domésticas. A secretária de Assuntos Internacionais da Fazenda, Tatiana Rosito, vai representar Haddad nas reuniões anuais e nos compromissos do G20. O subsecretário de Dívida Pública da Fazenda, Daniel Leal, também deve participar.
Desta vez, a ausência do ministro da Fazenda ocorre em meio às contínuas pressões fiscais no País. O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prepara um pacote de bondades com impacto estimado em R$ 100 bilhões em 2026, ano eleitoral, mas enfrenta impasses para financiá-lo, a exemplo da derrota do IOF na semana passada, conforme mostrou o Estadão/Broadcast.
Ao não comparecer às reuniões do FMI, Haddad também perde um palco internacional importante e a chance de falar a investidores estrangeiros sobre o Brasil em eventos paralelos, promovidos por bancos de investimento como Itaú BBA, UBS, XP, JPMorgan e outros. O momento é relevante porque o capital estrangeiro migra para os países emergentes em meio à fraqueza do dólar, resultado das medidas do governo Donald Trump.
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Foto: Aline Bronzati/Estadão Conteúdo
Estudo do FMI publicado nesta semana mostra que, após sucessivas ondas de aversão ao risco, os países emergentes têm se beneficiado do maior apetite dos investidores globais. Segundo o Fundo, trata-se de uma combinação de boas práticas monetárias e fiscais, temperada com uma pitada de sorte. O organismo recomenda, porém, que o ‘botão de alerta’ permaneça ligado diante dos juros mais altos, das tensões geopolíticas e da deterioração do espaço fiscal em várias economias.
Mesmo sem Haddad, Galípolo também não deve ir a eventos de bancos, que acontecem às margens das reuniões anuais do FMI, apurou a Broadcast. Com isso, a representação do Brasil junto a investidores estrangeiros deve ficar a cargo do segundo escalão. No caso do evento do Itaú BBA, esta prevista a participação do subsecretário de Dívida Pública da Fazenda, segundo fontes.
A falta de Haddad também descarta qualquer chance de o ministro ter alguma conversa presencial com fontes do governo de Donald Trump sobre a questão do tarifaço. O chefe da Fazenda foi um dos ministros designados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para negociar pelo lado brasileiro. Nesta semana, o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, telefonou para o chanceler brasileiro, Mauro Vieira, e acertou uma reunião em Washington para breve.
Quanto ao FMI, além de Galípolo, também participam das reuniões anuais do FMI os diretores de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos e de política monetária do BC, Paulo Picchetti e Nilton José Schneider David, respectivamente.
Em artigo publicado nesta semana, os economistas do Fundo Swarnali A. Hannan, Daniel Leigh, e Rui Xu reconhecem que a transmissão da política monetária no Brasil permanece ativa. “A economia do Brasil está mostrando sinais de moderação em meio a políticas monetárias e fiscais restritivas e à elevada incerteza política global”, avaliam.
Resiliência em xeque
Segundo a diretora-geral do FMI, a resiliência do mundo ainda não foi totalmente testada. “E há sinais preocupantes de que o teste pode vir”, alertou Georgieva, mencionando a crescente demanda global por ouro como um sinal, em discurso que antecede as reuniões na próxima semana.
Washington segue contribuindo para a instabilidade. Nesta sexta-feira, o presidente Donald Trump ameaçou novas tarifas comerciais contra a China antes do fim do prazo limite, novembro, ampliando a aversão a ativos de risco ao redor do globo.
“O mercado está reavaliando a situação [entre os EUA e a China], reconhecendo que tanto as tarifas diretas quanto as secundárias podem ser mais prováveis do que se antecipava anteriormente”, diz o presidente do Queen’s College e ex-chefe da gestora Pimco, Mohamed El-Erian.
Nos últimos dias, têm crescido alertas quanto ao risco de os mercados financeiros atravessarem uma forte correção de preços, levando em conta os elevados valuations em Wall Street. A própria Georgieva levantou a bola: “Se uma correção aguda ocorresse, condições financeiras mais apertadas poderiam arrastar o crescimento mundial para baixo, expor vulnerabilidades e tornar a vida especialmente difícil para os países em desenvolvimento”, concluiu.
Contato: aline.bronzati@estadao.com
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