Política
07/10/2018 07:00

Brasil vai às urnas neste domingo guiado por uma nova polarização


São Paulo, 06/10/2018 - Apesar do clima ora de surpresa, ora de euforia com a liderança de um político de menor expressão e sem estrutura partidária na corrida presidencial, o Brasil chega às urnas neste domingo dividido como sempre. É bem verdade que o tom e a intensidade da disputa pelo Planalto atingiu patamares novos nestas eleições com a explosão das fake news nas redes sociais e o atentado que quase tirou a vida do candidato do PSL, Jair Bolsonaro. Mas, levando-se em conta o que apontam as pesquisas, os brasileiros votarão obedecendo uma tendência que já se fazia presente nas corridas presidenciais brasileiras nas últimas quatro eleições.

A única diferença, agora, é que o papel de antagonista do lulopetismo foi transferido do PSDB para um candidato que se diz capaz de fazer o que os tucanos não conseguiram nos últimos 16 anos: derrotar o Partido dos Trabalhadores na urnas. De quebra, Bolsonaro traz a promessa de dar uma guinada à direita no País.

Desde 2002, os brasileiros têm mantido um padrão de votação extremamente polarizado, emulando, ao menos nos segundos turnos, eleições em países onde o bipartidarismo se tornou regra. Ao longo desses 16 anos, eleição após eleição, o PT vem observando um crescente aumento de sua rejeição na disputa pelo Planalto. Em 2002, José Serra obteve 38,73% dos votos válidos. Na eleição seguinte, o representante do PSDB ampliou em quase dois pontos sua votação, atingindo quase 40% dos válidos.

De lá para cá, as votações em adversários antipetistas têm crescido quatro pontos a cada eleição. José Serra obteve quase 44% dos votos em 2010 e Aécio Neves mais do que 48% em 2014. "Apesar de todo esse clima de surpresa que tomou conta do País com a chegada do Bolsonaro na primeira colocação, com chances de vencer no primeiro turno, os eleitores estão se comportando de forma bastante previsível", diz Leonardo Barreto, doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília e sócio da consultoria Factual. "O desenho político brasileiro está galvanizado, não estamos vendo mudanças. O que mudou, apenas, foi a titularidade desse movimento antiPT, por conta do desgaste do PSDB nesses últimos anos", diz ele.

Bolsonaro, de fato, galvanizou como nenhum candidato o antipetismo. Mas não só. Seu discurso anti-sistema também falou alto com o eleitorado que, costumeiramente, votou no PSDB na esperança de derrotar o PT nas últimas eleições. Ele conseguiu tirar os votos dos tucanos em todas as regiões do País, em todas as faixas de renda e em todas os níveis de escolaridade. "Bolsonaro conseguiu aglutinar em torno de si esse eleitorado mais à direita e que está descrente com a política. Esse não é um sentimento novo, está ai há pelo menos alguns anos e ele encaixou bem", diz o professor emérito da Universidade de Brasília, David Fleischer.

Pelas pesquisas eleitorais divulgadas às nos dias que antecederam a eleição, Jair Bolsonaro só não vencerá no primeiro turno por conta dos bolsões de fidelidade ao lulopetismo. Ele ainda não conseguiu penetrar nas áreas e faixas sociais que têm votado no PT de forma consistente e permanente desde 2002. Ele não lidera as intenções de voto no Nordeste, por exemplo, que nos últimos 16 anos só deu a vitória a um candidato tucano em um de seus Estados uma única vez, na Paraíba, na primeira eleição em que Lula foi eleito.

De lá para cá, o PT tem conquistado em torno de 70% dos votos válidos nos segundos turnos. Ele também não consegue liderar entre os brasileiros que ganham até um salário mínimo. "A lógica da divisão dos votos no Brasil segue obedecendo alguns elementos importantes das últimas eleições, como o Lulismo, o antipetismo", diz o cientista político e professor da Fundação Getúlio Vargas, Cláudio Couto. "O que surpreende, apenas, é o fim da dicotomia entre PT e PSDB e a desilusão com a democracia", diz.

Virada. Apesar de se dizer surpreso com a ascensão de um político mais radical e de menor expressão no cenário nacional como Bolsonaro, Couto acredita que o desenlace dessas eleições obedece a lógica se observado apenas os últimos anos no Brasil. "Ver a extrema direita assumindo esse protagonismo é surpreendente se olharmos o que foi a democracia brasileira nos últimos anos, mas não sob uma perspectiva de curto prazo."

O acirramento entre os dois polos ideológicos cresceu de forma exponencial nos últimos anos. Começou a ganhar força com os acenos de José Serra (PSDB-SP) a setores mais conservadores ao condenar o aborto de forma enfática na reta final das eleições de 2010. Ganhou musculatura com um governo extremamente intervencionista de Dilma Rousseff em seu primeiro mandato e foi galvanizado com os escândalos de corrupção que assolaram o PT e a negação de Aécio Neves (PSDB-MG) em questionar o resultado das urnas em 2014. "É uma eleição muito mais assentada no medo e no ódio do que assentada na discussão de propostas e na qualidade dos políticos que as apresentam", diz Rodrigo Augusto Prando, cientista político e professor da Universidade Mackenzie, de São Paulo.

Para ele, apesar de a disputa ideológica se manter e obedecer uma lógica coerente dentro do cenário político brasileiro, mudanças importante ocorreram nessa campanha. "Bolsonaro pode vencer essa eleição sem tempo de TV, sem um partido forte, sem coligações, sem recursos de financiamento", diz ele. "Essa será a primeira vez, de forma concreta, que vemos a reta final da eleição dando mais força e importância às redes sociais do que ao rádio e a TV".

Entre surpresas e previsibilidades, entre novas estratégias e velhas armas de campanha, o brasileiro também chega esse domingo sem a menor ideia de que como o país irá lidar com o resultado das urnas. Um certeza, no entanto, é unânime: o Brasil há de terminar 2018 ainda mais dividido do que começou este turbulento ano. (Yan Boechat, especial para o Broadcast Político)
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