Política
16/09/2022 09:44

Eleições 2022: Candidatos prometem alta de investimento, mas nenhum diz algo palpável, diz CBIC


Por Ana Paula Grabois

São Paulo, 14/09/2022 - José Carlos Rodrigues Martins, presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), entidade que representa 96 sindicatos e associações patronais do setor da construção no Brasil, enxerga como principal urgência do País destravar o Orçamento para permitir o investimento público em obras, como o programa de habitação popular Casa Verde e Amarela.

Crítico do que chama de "política paroquial" no atual Congresso, vê a reforma administrativa como saída para recuperar a capacidade de o setor público investir, antes da reforma tributária. Martins já conversou com as equipes dos quatro principais candidatos a presidente: o presidente Jair Bolsonaro (PL), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB).

Entre as dificuldades fiscais e a necessidade de infraestrutura do Brasil, ele conta que todos prometem que vão fortalecer o investimento e a habitação popular, mas "ninguém diz como". "Nenhum dos candidatos tem algo palpável, algo que eu possa dizer: 'acreditem nisso porque vai acontecer'", diz. Leia a primeira parte da entrevista exclusiva ao Broadcast Político.



Broadcast Político - Qual a principal questão do setor para o próximo governo?
José Carlos Rodrigues Martins -
É indiscutível que a principal questão é como voltar a ter capacidade de investimento. Tem um orçamento de R$ 5 trilhões, do qual foi destinado ao programa Casa Verde e Amarela R$ 83 milhões e R$ 2 bilhões para o Dnit fazer e conservar estradas. Nesse patamar de investimento, não tem continuidade de programas e atendimento às demandas sociais. Jogaram tudo para emendas parlamentares. Com isso, acabaram-se as políticas de Estado, virou uma política paroquial.

Broadcast Político - É o chamado orçamento secreto?
Martins -
Não só, falo de todas as emendas. Tem R$ 40 bilhões e o orçamento secreto é de R$ 19 bilhões, é mais ou menos a metade para cada. Tem os outros R$ 20, são as emendas de bancada, de deputado e senador. Tem R$ 800 milhões em carteira para investimentos em infraestrutura. Só nas rodovias Dutra e Rio-Santos são R$ 30 bilhões de investimento.

Broadcast Político - Está faltando muito dinheiro para investimento no País?
Martins -
Tem um buraco. O projeto estruturante está se desenvolvendo, foram feitas muitas concessões à iniciativa privada, mas esse meio, onde vivemos, tem zero de investimento. O Brasil deixou de ter uma política de habitação desde o BNH, na década de 80, e voltou a ter em 2009, com o Minha Casa, Minha Vida.

Broadcast Político - Falta uma política séria de habitação?
Martins -
Claro. Nesse vácuo de mais de 20 anos, as favelas inflaram no Brasil inteiro. As pessoas continuam nascendo, se separando e se casando. O crescimento da população é vegetativo, independe de política econômica. Isso está totalmente relegado a segundo plano.

Broadcast Político - Como o senhor avalia as propostas dos principais candidatos a presidente?
Martins -
Já falei sobre isso com as quatro equipes. O PT fala em acabar com o teto de gastos. É o caminho? A equipe do Bolsonaro fala em mecanismos via iniciativa privada. Nenhuma delas atende, nenhuma delas dá solução. Ninguém quer o Brasil em descontrole econômico. No fim do governo Dilma, tínhamos 3 milhões de trabalhadores com carteira assinada. Caímos para 2 milhões, perdemos um terço da nossa força de trabalho em dois anos. Imagine o desastre. Nesse período de pandemia, no governo Bolsonaro, recuperamos 500 mil trabalhadores.

Broadcast Político - O Brasil está em situação fiscal difícil. Como financiar a habitação, a infraestrutura, as grandes obras, com investimento público?
Martins -
A concessão está bem economicamente. O que não para em pé é uma estrada vicinal. É a coisa menor, a coisa que você, como cidadã, dentro da tua cidade, precisa. Ou a casa para uma pessoa que não tem cadastro para pegar financiamento na Caixa Econômica. Tem coisas que, não adianta, como em qualquer lugar do mundo, é o setor público que faz.

Broadcast Político - São áreas onde o setor privado teria risco ou não teria retorno financeiro?
Martins -
Em qualquer lugar do mundo é assim. Na Europa, casa para refugiados é com o setor público, o que equivale a uma invasão em área de risco no Brasil. Como vai pegar uma família que está em uma palafita, em um lugar degradado, como tirar ela dali se ela não tem capacidade? Estamos há alguns anos sem contratação nova, chegamos ao cúmulo de aquelas obras que pararam na época da Dilma por falta de pagamento e que foram retomadas no governo Bolsonaro, correrem o risco de parar de novo porque o Orçamento do ano que vem foi cortado. O nosso setor, como todo setor de investimento, como todo setor âncora para a economia, precisa de um mínimo de previsibilidade porque o investimento escapa. Todo mundo fala em reforma tributária, mas a reforma administrativa tem que vir antes. Onde já se viu resolver como vai pagar e não saber o que está pagando.

Broadcast Político - É mais urgente ter uma organização melhor do Orçamento com a reforma administrativa antes da tributária?
Martins -
Com a reforma administrativa, se você reduz o custo do Estado ao longo do tempo, você consegue ter flexibilidade para negociar a tributária.

Broadcast Político - Voltando às propostas dos candidatos, como avalia as do presidente Bolsonaro?
Martins -
O Bolsonaro fica em cima do muro, de que vai manter o teto, mas vem com várias exceções, sem dar nenhuma informação oficial de que vai dar uma flexibilizada aqui e ali, vai criar um mecanismo A, B, C e D. Junto com um grupo de entidades, tentamos colocar essa discussão do investimento. Como vai fazer pra continuar o investimento, continuar a resolver as necessidades do Estado, mas ter uma política de Estado, não através de emendas, que virou política paroquial.

Broadcast Político - E sobre as propostas de Ciro Gomes e Simone Tebet?
Martins -
Todos eles dizem que voltam com o investimento.

Broadcast Político: Mas não dizem como?
Martins -
Não dizem como e ficamos em uma situação insegura. Precisamos de um mínimo de credibilidade no futuro para fazer investimento agora. Todos eles dizem, como todo candidato, que vão fazer isso. Lula fala que a prioridade dele é gerar empregos em cima da construção, que vai retomar o PAC, que vai retomar o Minha Casa, Minha Vida. Nenhum dos candidatos tem algo palpável, algo que eu possa dizer: 'acreditem nisso porque vai acontecer'.

Broadcast Político - Tem outro ponto que o senhor considera importante para o ano que vem?
Martins -
O avanço sempre é necessário, mas às vezes é menos importante que o retrocesso. Houve avanços, principalmente na parte de relações trabalhistas e na parte ambiental. Na parte ambiental, sem afrouxar, agilizou as licenças ambientais. O padrão anterior era não dizer nem que sim nem que não e não saía. Queremos segurança. Quanta gente quebrou a cara trazendo investimento estrangeiro, botou dinheiro, tudo certinho, tudo licenciado. De repente, para tudo. Porque ao ficar discutindo por dez anos, já perdeu o timing, o dinheiro virou custo. Como explicar ao investidor no exterior que ele tinha toda a documentação certa e, ao fim, não tinha nada.

Broadcast Político - Com relação às mudanças trabalhistas?
Martins -
O grau de conflito melhorou enormemente nas relações trabalhistas. Não vejo mais empresário reclamar que vai comprar uma máquina em vez de contratar um trabalhador. Isso também não pode sofrer retrocesso. Deixou claro o PJ e acabou com a aventura da ação trabalhista em tudo quanto é canto. Esses avanços precisam ser preservados.

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