Economia & Mercados
13/07/2020 09:32

Demanda por seguro cyber cresce em pandemia, mas preço sobe e seguradoras se retraem


Por Aline Bronzati

São Paulo, 13/07/2020 - O crescente número de ataques de hackers na pandemia fez disparar a procura por seguro que protejam as empresas contra crimes cibernéticos. O salto na demanda, associado à piora generalizada do risco, porém, encareceu o custo das apólices, que já não era convidativo. Ao mesmo tempo, fez com que as seguradoras se retraíssem.

A lista de empresas atingidas por invasões cibernéticas não para de crescer. Mais pessoas trabalhando em casa significou aumento de vulnerabilidade e uma porta de entrada mais fácil aos hackers. O grupo de empresas inclui nomes como o da concessionária fluminense Light, a estatal Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Avon, Honda, Energisa, Raízen, Rumo, o Grupo EDP - com um ataque global, e Hospital Sírio Libanês. Essa semana, a operadora de planos de saúde Hapvida informou à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), xerife do mercado de capitais, que sofreu um incidente de violação de segurança cibernética - envolvendo dados cadastrais de clientes, mas sem interrupção de suas operações.

Diante dos ataques em massa, o mercado de seguros sinaliza um endurecimento nas condições dos contratos a serem renovados no segundo semestre. Pesa, sobretudo, não só uma maior procura pela contratação da apólice em meio à covid-19, como o interesse das empresas em ampliarem seus limites de cobertura, diante do medo de serem alvo de hackers sem a devida proteção.

"O seguro cyber chegou ao Brasil há alguns anos, mas ninguém dava atenção. A procura começou a aumentar por conta da entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), que previa multas até R$ 50 milhões em caso de descumprimento", diz o advogado sócio do Machado Meyer, Eduardo Castro.

A pandemia, porém, agravou o risco. Seguradoras que olhavam o mercado com otimismo, principalmente, por conta da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, que teve sua entrada em vigor postergada em meio à pandemia, agora, têm cautela. A norte-americana Liberty, por exemplo, desistiu de ingressar no segmento de riscos cibernéticos, ao menos por ora, conforme apurou o Broadcast.

O braço de riscos corporativos da alemã HDI, que também rondava este mercado, seguiu adiante com os planos, mas de forma tímida e sem alarde. Emitiu menos de R$ 95 mil em prêmios em fevereiro, conforme a Superintendência de Seguros Privados (Susep). Depois que a pandemia começou a se propagar no Brasil, não fechou novos contratos.

Os números do mercado de riscos cibernéticos seguem pouco expressivos. O segmento ganhou um impulso extra, porém. No acumulado do ano até maio, foram R$ 13,682 milhões em prêmios, mais que o dobro do visto no mesmo intervalo de 2019. Em todo o exercício passado, os prêmios emitidos não chegam a R$ 21 milhões.

"Naturalmente, a demanda das empresas aumentou muito. Isso traz oportunidade para o mercado", afirma o diretor de linhas financeiras da seguradora suíça Zurich, Fernando Saccon. "Em uma carga menor, a pandemia será para o seguro cyber, o que a Lava Jato foi para o D&O - que protege o patrimônio dos executivos." A referência é ao movimento que veio a reboque do escândalo de corrupção, com os executivos mais preocupados em se protegerem de questionamentos na Justiça.

O aumento de demanda tem sido sentido de todos os lados. A superintendente de riscos cibernéticos da corretora Marsh, Marta Schuh, tem tido uma média de cinco reuniões por dia com empresas interessadas em contratar seguro para riscos cibernéticos. Por outro lado, ela tem sido acordada de madrugada com companhias acionando a corretora por incidentes durante a pandemia.

A conta para as seguradoras já começa a aparecer. O volume de sinistros registrados somente em maio foi de quase R$ 10,8 milhões, mostram dados da Susep. No acumulado do ano, para se ter uma ideia, são R$ 12,269 milhões - ou seja, a maior concentração já se deu durante o auge das medidas de isolamento social.

"A dependência tecnológica aumentou muito na pandemia, com todos em home office e acessando plataformas paralelas. Temos uma nova dimensão de risco, que aumentou e estamos conhecendo agora", diz a advogada sócia e especialista em seguros do Demarest, Marcia Cicarelli.

Mais do que tecnológico, um ataque cibernético representa um risco operacional para as empresas uma vez que, a depender da gravidade, pode causar a interrupção dos negócios. Essa já tem sido a leitura de agências de classificação de risco e órgãos reguladores. "Banco Central, Moody's, S&P e Fitch Ratings já admitiram que o risco cibernético se tornou operacional. Um ataque cibernético pode impactar não só os negócios, mas atingir terceiros", diz Schuh, da Marsh.

Segundo ela, estimativas da Marsh mostram que cada crime tem gerado prejuízos iniciais de R$ 100 milhões às companhias brasileiras. A maior preocupação com os estragos atrelados a um ataque de hackers tem feito com que as empresas procurem coberturas mais altas. Em alguns casos, o dobro do limite até então contratado, que pode ir até R$ 100 milhões.

Como consequência, o preço do seguro, que já era considerado 'salgado', tem aumentado. As taxas vão de 0,5% a 5% do limite. Mas a média do mercado brasileiro tem variado de 1% a 2%, de acordo o sócio da 3 Seg Seguros, Alexandre Laender Delgado. "É um mercado pequeno. Prevalece o conceito de mutualismo, com poucas apólices, o risco não é diluído e isso dificulta a precificação", diz.

Apesar de mais atentas, o olhar das empresas também tem de mudar em relação ao seguro cibernético, na visão do especialista. Isso porque geralmente as companhias veem na apólice uma forma de reporem seu prejuízo, quando, na verdade, a intenção é minimizá-lo. Se para contratarem um seguro patrimonial, as empresas têm de tomar medidas de gerenciamento de risco, no caso do cibernético, a lógica é a mesma.

Contato: aline.bronzati@estadao.com
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